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    Meia Hora e as Manchetes que Viram Manchete
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    João Carlos Correia
    João Carlos Correia

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    3,0
    Enviada em 4 de janeiro de 2018
    Nos idos do século XIX, com o advento da Revolução Industrial, a edição tanto de livros quanto de periódicos tornaram-se mais baratas devido à diminuição do preço do papel e da tinta, o que levou a um aumento de publicações. Foi nessa época que surgiram os grandes jornais que circulam até os dias de hoje como, por exemplo, The Times (fundado na Inglaterra, em 1785). Somando-se a tudo isso estava o fato de ter aumentado o número de pessoas escolarizadas e que sabiam ler, pois a Classe Trabalhadora começava a ter acesso às escolas. Surgiram publicações voltadas para esse novo público, com assuntos de seu interesse, que primavam por uma linguagem mais informal e, até mesmo, uma gramática descuidada.
    Na imprensa surgiu o tabloide, um jornal de tamanho menor que o usual, com poucas páginas, que permite uma leitura mais rápida e dinâmica das notícias e com um preço mais em conta. Esse novo tipo de mídia surgiu em Londres e tornou-se muito popular entre os leitores, em especial os trabalhadores. Os tabloides ingleses se destacavam – e ainda se destacam - por dar ênfase a notícias de forte apelo ao gosto popular sobre esportes, sexo, escândalos (políticos e/ou amorosos), fofocas sobre artistas, violência e, é claro, da vida particular da família real inglesa. Todos com as manchetes da primeira página impressas em letras bem grandes e, quase sempre, com a foto de uma bela mulher seminua. Como resultado, esses jornais tinham – e têm - altas vendas. Esse tipo de jornalismo ficou conhecido como “Red Top” (em inglês, uma expressão equivalente a sensacionalismo).
    Como não podia deixar de ser, esse novo tipo de jornalismo (embora haja pessoas que hesitem em chamá-lo assim) espalhou-se para outros países, inclusive o Brasil. Os jornais surgidos em terras brasileiras seguiam os moldes dos tabloides ingleses. Seus representantes mais famosos eram o Notícias Populares, de São Paulo; e O Dia, do Rio de Janeiro. O Dia, de fato, era um representante desse tipo de jornal, pois houve uma mudança de linha editorial. Porém, gerou um “filhote”: em 2004, nasceu o jornal Meia-Hora, que é o tema do filme que vamos analisar.
    Meia Hora e as Manchetes Que Viram Manchete é um documentário – um gênero de filme que, felizmente, cada vez mais cai no gosto do público brasileiro – dirigido e produzido pelo jovem diretor Angelo Defanti, que se notabilizou por documentários e filmes de curta-metragem como, por exemplo, A Melhor Idade (2011), que deu o prêmio de melhor ator em curta-metragem de 35 mm a José Wilker (de, Bye, Bye, Brasil) no Festival de Gramado. Meia Hora é o seu primeiro trabalho na direção de um longa-metragem e, pode-se dizer, teve um bom começo com uma direção correta e precisa, embora sem nenhuma novidade, mas isso não compromete o seu trabalho no geral.
    Meia Hora e as Manchetes Que Viram Manchete conta a história do Meia Hora desde os seus primórdios, sendo apresentado como um sucessor do jornal O Dia, que, como já foi dito, mudou sua linha editorial (antes disso, seguia a linha sensacionalista) e passou a ser um jornal dito “sério”. Essa história é narrada pelos funcionários e ex- funcionários do periódico tais como Alexandre Freeland, David Brazil, Flávio “Tiozão” Trindade, Henrique Freitas, Humberto Tziolas, Washington “Apolinho” Rodrigues e Gigi de Carvalho, a ex-proprietária do Grupo O Dia.
    As histórias contadas concentram-se principalmente nas manchetes do jornal – escandalosas, polêmicas e de duplo sentido - tais como “Yes, We Créu”, “Fátima abandona Bonner para fazer programa”, “Nasceu negro, ficou branco e vai virar cinza – Descanse em paz, Michael [Jackson]” nas quais há largo uso das já citadas linguagem informal e gramática descuidada e em expressões coloquiais como “bonde sinistrão” (facção criminosa), “tranca” (cadeia), etc. Além disso, há também destaque para o futebol, notícias policiais, a seção diária “Gata da Hora”, na qual jovens aspirantes a artistas e modelos tentam a sorte posando para fotos em trajes mínimos e fazendo poses sensuais. O público feminino (assim como o LGTB) também não foi esquecido com a seção semanal “Bofe da Semana”. Tudo isso são coisas que, segundo os narradores, o público gosta, e que se traduz em altas vendagens, que também é destacada no filme, assim como seu baixo preço (atualmente custa R$ 1,00).
    Por vezes, tem-se a impressão de estarmos vendo mais um filme de propaganda do que propriamente um documentário, visto que a maior parte dos depoimentos são de pessoas que são, ou foram, do jornal e, naturalmente, “puxam a sardinha” para o seu lado. Uma das poucas depoentes do filme que não trabalhou, ou trabalha, para o Meia Hora é a funkeira Valesca Popozuda, frequentadora assídua das manchetes do periódico e que admite, sem nenhum constrangimento, que adora aparecer na capa do jornal, pois isso ajuda em sua carreira. E, é claro, em agradecimento aos amigos do jornal, também faz uma propagandazinha. E vai a pergunta que não quer calar: por que ela foi a única artista a aparecer no filme?
    Esse aspecto de propaganda é amenizado com os depoimentos de Muniz Sodré, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Sylvia Debossan Moretzsohn, professora da Universidade Federal Fluminense (UFF). Sylvia destaca o aspecto do sensacionalismo no estilo “sangue-sexo-futebol” (semelhante ao “pão e circo” da antiga Roma) que gera manchetes ditas preconceituosas, machistas e homofóbicas. Já Muniz destaca o jornal como diversão e entretenimento visto que é, segundo suas palavras, um “meio-jornal” (devido ao formato tabloide) com as notícias de sangue que faz o gosto dos leitores. Dos dois, creio ser Muniz quem melhor compreendeu o Meia Hora.
    Para mim, a parte mais interessante do filme é a da notícia, destacada por todos os jornais, do terrível acidente aéreo com voo 3054 da companhia TAM, em São Paulo, ocorrido em 2007, no qual faleceram 199 pessoas. São mostradas, em uma comparação, as manchetes do Meia Hora com as dos grandes jornais brasileiros, como a Folha de São Paulo e O Globo, sobre o ocorrido. E ao ver essas manchetes, é possível perceber que, em uma tragédia como essa, os jornais considerados “sérios” acabam por se equivaler aos ditos “sensacionalistas”.
    Dizem que ninguém cai na mesma história duas vezes, a não ser que tenha perdido a primeira. Por isso, sim, é possível explicar o fenômeno, visto que não é novo e, portanto, não chega a ser uma “revolução”, como chegam a afirmar no filme. Em São Paulo, por exemplo, o Meia Hora, quando foi lançada a sua edição paulistana, em 2010, não fez sucesso e encerrou suas atividades, em 2011 (esse fato é dito em poucas palavras no filme). Em grande parte, isso deve ao jornal Notícias Populares, que deixou uma forte marca na população local, a ponto de o jornal carioca não causar nenhuma surpresa na terra da garoa.
    Devido à ênfase dada às manchetes e ao seu aspecto polêmico, Meia Hora e as Manchetes Que Viram Manchete, não raro, acaba por ficar repetitivo e um pouco cansativo. Talvez se, ao invés de cerca de 80 minutos de filme, fizessem cerca de 50 minutos, teria sido um tamanho mais adequado. Entretanto, vale o registro feito pelo documentário e, também, vale a ida à sala de exibição para checar esse mesmo registro.
    Caio B.
    Caio B.

    8 críticas Seguir usuário

    3,0
    Enviada em 13 de janeiro de 2016
    O jornalismo no Brasil está acabando. É como um velho cansado e doente que todo mundo vive decretando a sua morte, mas ele luta, dá seus suspiros de vida por meio, principalmente, da mídia alternativa, de jornalistas guerreiros e de sacadas de marketing. O jornalismo das grandes empresas de uns tempos pra cá escancarou a sacanagem, a má intenção e principalmente a manipulação e o completo desdém pelo leitor, chamando-o de burro na cara larga.

    A cada capa de revista com notícia falsa e de corte nas redações, é como se um órgão desse importante e doente paciente parasse. Reanimá-lo está difícil, mas existem os sopros e um deles é o jornalismo popular descompromissado. Caso do popularesco jornal Meia Hora, do Rio de Janeiro.

    Entrando em cartaz neste sábado (8/8), o documentário “Meia Hora e as manchetes que viram manchete”, de Ângelo Defanti desnuda o último jornal popular do país em seu formato clássico. Nada de política, muito sangue, futebol, mulher pelada e humor.

    “Atendemos ao que o povo quer ver e não podemos mexer uma vírgula nesse conceito”, diz um dos editores ao citar que em pesquisa além das características acima, descobriu-se que as pessoas querem se informar, mas com textos curtíssimos, muitas fotos e principalmente pagar pouco.

    O documentário, de 81 minutos, é bom. Conta os bastidores das capas e da turbulenta criação do jornal de forma impecável, mas peca ao não mostrar o dia a dia da redação e nem de fazer um histórico dos jornais populares. Todos eles, que existiram e, claro, o Meia Hora, devem a abertura do nicho ao famigerado Notícias Populares, de São Paulo, que durou de 1963 a 2001.

    Se você não conhece o periódico, tem preconceito com jornalismo popular ou não se interessa pela área, nem perca seu tempo assistindo o filme. Agora, se quer ver como é feito um produto despretensioso, levando as notícias da redondeza ao leitor mediano e encarando as mazelas da vida e do jornalismo com bom humor, é imperdível.

    Produtos como o Meia Hora fazem o jornalismo do andar de baixo. Cumprem uma nada pretensiosa função social. É o veículo de comunicação do povo que pega duas conduções pra trabalhar, marmita, cachaça, futebol, samba no domingo e quer saber o que acontece na sua cercania e com o preço no supermercado, enfim, quem carrega o Brasil nas costas.

    O paciente jornalismo agradece.
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