Desejo e privação
por Bruno CarmeloEste projeto não se desvenda facilmente ao público. Como em seu filme anterior, O Exercício do Caos, o diretor Frederico Machado aposta em construções fragmentadas, silenciosas, que desenham aos poucos uma narrativa. Enquanto o primeiro filme desta trilogia flertava com a alteridade através do terror, O Signo das Tetas busca a transcendência pelo processo ritualístico.
De fato, os corpos passam por diversas provações. Um homem sem nome (Lauande Aires), atormentado pela figura da mãe idosa, vaga pelas cidades do interior do Maranhão. Ele experimenta vários tipos de catarse, como a arte (a dança, a poesia de Nauro Machado, a música da festa), o sexo com prostitutas, o contato com a natureza (as águas do rio, as frutas), a religião (uma Bíblia encontrada no quarto de hotel). Ele é atormentado pelos próprios desejos em decorrência de um Complexo de Édipo mal resolvido – o personagem não consegue esquecer os seios da própria mãe.
Frederico Machado cria imagens belíssimas, mas nada óbvias: ao invés de crucifixos, masturbação e outros ícones diretos do desejo sexual e da religião, ele prefere construções fantasmáticas, como as mulheres nuas no rio, a mãe idosa tomando banho, as máscaras da festa. A câmera foca em cada parte dos corpos, enquanto Lauande Aires demonstra feições pertinentemente vagas, tão etéreas quanto o próprio filme. Não existem certezas ou significados únicos nesta espécie de ode aos corpos em crise.
O Signo das Tetas demonstra certa melancolia ao olhar para o fracasso do macho e do adulto. Os corpos se tocam mas não se conectam, os olhares não se cruzam, as frases não encontram respostas. O protagonista vai do nada a lugar algum, move-se quase por inércia, buscando por algo que não sabe o que é. O filme reata com a noção de deambulação herdada do cinema marginal, mas com um mergulho nos aspectos psicológicos do personagem, ao invés de político-sociais como nas obras de Ozualdo Candeias, por exemplo.
Rumo ao final desta história curtíssima, pode-se ficar com a impressão de que nem todos os signos estão acessíveis, nem todos os significados se desvendam com facilidade. Do mesmo modo, a divisão em capítulos serve mais a resgatar uma aura erudita (da literatura, da estrutura teatral) do que alavancar a narrativa. Mas O Signo das Tetas se constrói no equilíbrio delicado de opostos: a música sertaneja popular contra a sonata para piano de Schubert, o realismo dos corpos comuns contra os cenários noturnos beirando o fantástico, a materialidade da natureza e a abstração dos desejos. O projeto, assim como o personagem, situa-se na fronteira entre extremos, demonstrando grande interesse pelas bordas, mas sem querer optar por apenas uma delas.