O documentário “Cássia Eller”, dirigido por Paulo Henrique Fontenelle, começa e termina com o mesmo momento. Na cena, vemos a cantora carioca falando a respeito de si mesma. Mais precisamente, sobre como as pessoas acham que a conhecem verdadeiramente, seja por conversarem com ela, por saírem com ela ou por dormirem com ela. Entretanto, na mente de Cássia, as pessoas só poderiam se aproximar de verdade dela, de uma maneira mais próxima, se a ouvissem cantar. Somente assim para ela se mostrar de verdade, para quem quer que seja.
Nesse ponto, as pessoas que privavam da intimidade de Cássia Eller e que emprestam depoimentos ao filme de Fontenelle são unânimes ao afirmar que, na sua vida privada, a cantora era uma pessoa muito tímida e que se revelava mesmo era no palco. Era ali que Cássia se mostrava como um verdadeiro furacão, com sua voz grave, poderosa e sua interpretação única para as muitas canções que ela gravou, dos compositores dos mais diversos estilos e gêneros.
Se a imagem da persona pública de Cássia Eller que todos nós tínhamos era essa, dentro dos palcos, o que o documentário nos apresenta é aos outros arquétipos que estavam presentes em sua vida. A mãe Cássia, a esposa Cássia, a filha Cássia, a amiga Cássia, a colega de trabalho Cássia e a irmã Cássia – todas – estão presentes nos diversos depoimentos que são dados no filme, que analisa, de uma certa maneira, o pioneirismo artístico e pessoal de uma artista que deixou uma marca inegável, dentro e fora dos palcos.
Paulo Henrique Fontenelle fez um documentário que faz justiça à sua personagem principal, na medida em que nos mostra o paradoxo que fazia parte de Cássia Eller, uma pessoa tímida, delicada, amorosa e preocupada com os outros na sua vida pessoal; e que, nos palcos, na profissão que escolheu abraçar, se mostrava forte, decidida, imponente, irreverente e ousada. Se fica uma certeza para a gente, ao final de “Cássia Eller”, é que Cássia estava errada. Não bastava ouvi-la cantar para conhecê-la de verdade. Nós sabemos quem nós realmente fomos quando somos confrontados com o olhar do outro sobre nós mesmos.