Jogador nº 1 - Easter eggs e a celebração da cultura pop
Antes de falar do mais recente filme do diretor Steven Spielberg – Jogador Nº 1 – se faz necessário falar primeiramente da importância do seu diretor. Para qualquer pessoa que cresceu na década de 1980 e 1990, principalmente os que hoje são deslumbrados com o cinema, o nome do americano Steven Spielberg é sempre recorrente nas lembranças fílmicas. Spielberg foi responsável pela direção de diversos filmes clássicos que habitam as memórias de vários cinéfilos e admiradores da sétima arte: Tubarão (1975), Indiana Jones e os Caçadores da Arca Perdida (1981), E.T. - O Extraterrestre (1982) e Jurassic Park (1993). Isto sem falar dos filmes que anunciavam Spielberg como roteirista, Poltergeist (1982) e Goonies (1985), ou como produtor executivo Gremlins (1984), De Volta para o Futuro (1985), Uma cilada para Roger Rabbit (1988) e Aracnofobia (1990). Enfim, qualquer menção ao nome de Steven Spielberg nas chamadas da Sessão da Tarde era sinônimo de um bom filme, mesmo quando estes filmes eram reprisados diversas vezes. O legado do diretor Steven Spielberg o coloca como um dos cineastas mais populares e influentes não apenas da história do cinema, mas também da própria cultura pop. Neste ano, ele confirma sua popularidade com o filme Jogador Nº 1, em um filme repleto de referências da cultura pop de diversas décadas.
O filme Jogador Nº 1 é baseado no livro homônimo de Ernest Cline, que também assina o roteiro juntamente com Zak Penn, sobre uma sociedade distópica, na qual a população busca o espaço virtual chamado OASIS para fugir de sua realidade deprimente. Na utopia virtual de OASIS os usuários podem ser quem eles desejam ser, os desejos da conturbada realidade são realizados nas infinitas possibilidades do virtual. O fundador da OASIS, James Halliday (Mark Rylance), antes de morrer, deixa escondido neste mundo virtual um tesouro (os easter eggs) que dará ao jogador que resolver todos os enigmas um grande prêmio e fortuna. Wade Watts (Tye Sheridan) é um destes usuários que parte nesta corrida em busca de uma mudança brusca da sua realidade através da sua vitória no mundo virtual. Porém, uma megacorporação almejando o controle (e o lucro) total do OASIS, também está em busca do tesouro deixado por Halliday.
O longa metragem combina ambientes e personagens tanto de ação ao vivo quanto os de imagens geradas por computador, o que mostra a versatilidade do diretor Spielberg. Assim percebemos que a vasta experiência com filmes de aventuras em live-action, assim como a direção da surpreendente animação As Aventuras de Tintin (2011), possibilitaram a competente direção desta aventura moderna que unifica cenários e atores, reais e animados. Além disso, Jogador Nº 1 também se destaca pelos outros elementos que compõem o filme: bom roteiro, apesar de previsível; fotografia satisfatória, que consegue definir a realidade saturada e fantasia colorida do virtual; com competentes atuações. Só é lamentável o fato que os personagens secundários não tenham sido tão bem desenvolvidos quanto o protagonista. Assim, como os princípios que motivam o antagonista engravatado Sorrento (Ben Mendelsohn) que na realidade é a representação de uma grande corporação capitalista, que pretende monetizar o OASIS elevando os lucros, através de cobranças de mensalidades dos usuários e disponibilização de espaços para publicidades.
Entretanto, particularmente acredito que o principal destaque do filme é a chuva de referências da cultura pop, que funcionam como um verdadeiro easter eggs para o espectador. Para quem não sabe os easter eggs, ovos de páscoa em tradução literal, são brincadeiras presente em diversos meios virtuais (filmes, jogos, páginas da internet) que contém alguma surpresa (ou não) para aqueles que encontrarem os segredos deixados pelos desenvolvedores. No filme Jogador Nº 1, da mesma forma que os personagens buscam os easter eggs dentro do Oasis para tentar encontrar o tesouro deixado por Halliday, o espectador busca as diversas referências da cultura pop presentes praticamente em cada enquadramento que compõem o filme. São tantas referências a filmes, a games, seriados e animes, de diferentes épocas que fica até difícil enumerar todos por aqui: o carro DeLorean do filme De Volta para o Futuro, os lutadores Ryu e Chun-li de Street Fighter, a roupa usada por Michael Jackson no videoclipe de Thriller, os vilões clássicos da década de 1980 Freddy Krueger e Jason, as músicas Take on me do A-há e Stayin Alive do Bee Gees, as diversas citações de “Rosebud” referência ao clássico Cidadão Kane de Orson Welles de 1941, e é claro, não poderia faltar o Batman.
Se em alguns destes casos são referências da cultura pop que aparecem em pequenos detalhes ou momentos da narrativa, outros são verdadeiras homenagens aos criadores destes ícones que ultrapassaram as barreiras das suas mídias e se eternizaram na nossa cultura: a participação do King Kong e a sua cena clássica no alto do prédio, o Gigante de Ferro com sua bondade e todo potencial bélico, o boneco assassino Chucky do filme O Brinquedo Assassino (1988) em uma boa cena cômica e a fantástica reconstrução do Hotel Overlook de O Iluminado (1980) que possibilita uma das mais divertidas sequências do filme, aproveitando os elementos criados na narrativa de Stanley Kubrick.
Em seu último ato o filme ainda consegue fazer uma ligeira crítica ao fascínio do ser humano com as mídias (e outros meios) que supostamente podem te tirar da sua realidade. Dessa forma, o filme nos coloca a (re)pensar sobre a nossa interação com os meios tecnológicos. Neste sentido, e trazendo para nosso momento, os games, as redes sociais e até mesmo o cinema podem funcionar como possíveis escapes da nossa realidade, mas jamais devemos confundir estes dois parâmetros. A realidade por mais dura que seja, é a realidade, devemos procurar formas de tentar mudar esta situação e não procurar alternativas que funcionem como válvulas de escape. Por fim, Jogador Nº 1 é um filme que diverte, que celebra a nostalgia e principalmente resgata a popularidade de Steven Spielberg de outras eras.