O supervalorizado do ano. É verdade que ganhou inúmeros prêmios pelo mundo afora, como nos festivais do Rio de Janeiro, São Paulo, Paulínia, Santa Maria da Feira (Portugal), inclusive ganhando o prêmio da Federação Internacional de Críticos de Cinema (FIPRESCI) em Toulose. Tem seus méritos, mas em suas devidas proporções.
Casa Grande é um filme com pretensões socializantes, ao abordar a lenta decadência moral e financeira de uma rica família brasileira. Mas também, persegue o adolescente Jean (Thales Cavalcanti), as suas descobertas e sua busca pela própria identidade (o vestibular, a vida afetiva e sexual, etc.).
As mudanças que o País, a família e o próprio Jean atravessam – e tudo colocado sob a perspectiva do adolescente – dão ao filme uma consistência volátil e pastosa, de que tudo é definitivo e tudo está se transformando depressa demais. Como a adolescência e o Brasil, dos últimos... dez anos.
E, de fato, é esse o Brasil que percebemos passear na telona durante a projeção do filme, o Lula no poder, a política dos projetos sociais, a ascensão dos menos favorecidos à classe média, a queda de Eike Batista...
Marcello Novaes é Hugo, um homem bem-sucedido que mora numa mansão, num bairro bacana do Rio de Janeiro, e que, de uma hora para outra, se vê falido e enredado em dívidas. Orgulhoso, se nega a aceitar sua derrocada, mesmo caindo a olhos vistos, cortando as despesas, economizando a eletricidade, demite o motorista, faz o filho andar de ônibus, corta as mesadas da filha Nathalie (Alice Melo), etc.
Novaes está ótimo no filme, e é uma pena que seu personagem seja a mesma coisa do começo ao fim, unidimensional, monotom e sem profundidade.
Ao contrário de Jean, que vai saindo de uma espécie de “cópia ideológica” do pai, para se tornar alguém com uma cara própria.
Em tempos de radicalizações políticas, Casa Grande parece ser um afago à esquerda no cinema brasileiro, por mais que o diretor Fellipe Barbosa – estreando aqui em longas-metragens – procure tratar o assunto com elegância, suavidade e sutileza.
Há de fato um apuro no ritmo, na movimentação da câmera, na mise-en-scène, mas o roteiro, mesmo com diálogos ágeis, inteligentes e bem construídos, tem alguns problemas que saltam à vista.
Principalmente quando coloca questões sobre projetos sociais na boca dos personagens. O “debate” sobre política de cotas raciais chega a ser desconfortável para o público e maniqueísta para o filme. E o final, embora demonstre transformação de Jean em sua jornada individual rumo ao autoconhecimento e embora isso seja tratado com lente elegante pelo diretor, é fraco e moralizante, colocando debaixo do tapete o tenso conflito entre as classes que se esboçou logo no início do filme.