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    Junho - O Mês que Abalou o Brasil
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Junho - O Mês que Abalou o Brasil

    Copa das manifestações

    por Francisco Russo

    O roteiro estava escrito e pronto para ser rodado: algumas das principais seleções desembarcariam no Brasil para estrelar a Copa das Confederações, realizada em suntuosas arenas especialmente construídas (ou reformadas) para apresentar tamanho espetáculo ao mundo. Entretanto, algo estava fora do script. Em diversas cidades do país, milhares iam às ruas para protestar. Contra o aumento das tarifas do transporte público, contra os partidos, contra a FIFA, contra tudo. O sinal amarelo foi imediatamente ligado e, em certos momentos, o vermelho piscou. Algo acontecia, inesperado para quem protestava e também para quem era alvo dos protestos. O que fazer?

    Um ano depois das manifestações ocorridas durante a Copa das Confederações, chega ao circuito comercial o documentário Junho - O Mês que Abalou o Brasil. De título preciso, o filme a princípio pode soar oportunista. Não apenas pelo aniversário dos eventos, mas também por ser lançado às vésperas da Copa do Mundo, cuja magnitude pode atrair situações parecidas ou até maiores, e também como tentativa de influenciar um complicado ano eleitoral. Entretanto, o pré-conceito se desfaz no decorrer do filme dirigido por João Wainer, um relato abrangente e plural sobre o que aconteceu no período.

    Bastante didático, Junho segue os acontecimentos de forma cronológica, apresentando as queixas e os fatos dia após dia. Do Movimento Passe Livre ao caos do transporte público nas grandes metrópoles. Da truculência policial à formação educacional (e histórica) da população. Do #vemprarua aos diferentes grupos que, cada um com seus interesses, ampliaram a gama de reclamações sobre o status quo. Das redes sociais ao jornalismo-cidadão, produzido no olho do furacão. Das críticas à imprensa à reviravolta realizada por alguns veículos de comunicação. Tamanha diversidade fez com que um manifestante não pensasse duas vezes antes de dizer: "O Partido dos Loucos foi criado".

    De loucura, é claro, não há nada. Mas impressiona a imensa quantidade de temas que se misturaram naquelas semanas de eventos intensos e explosivos, ainda mais quando analisados com um certo distanciamento. É bem verdade que ainda é cedo para se ter plena noção do impacto das manifestações na sociedade brasileira, o máximo que se pode ter é a noção de consequências imediatas, importantes mas que tendem a se perder em um contexto histórico a longo prazo. Junho, o documentário, tem como grande mérito a recriação deste "caos temático". Mesmo sem se aprofundar tanto em cada um dos assuntos abordados, eles são lembrados de forma a justificar o porquê de terem vindo à tona. E, neste ponto, vem o trunfo do filme: a edição.

    Diante da enxurrada de imagens produzidas sobre as manifestações, houve um trabalho minucioso que fez com que, em meio às explicações diárias, surjam verdadeiras pérolas. Como a conversa entre um manifestante mascarado e um policial, cada um apresentando seu ponto de vista sobre o evento. Ou a análise sobre o uso de balas de borracha, aproveitando uma oportuna associação com o método de atuação da polícia nas periferias. São momentos que, por si só, revelam mais do que qualquer narração em off e que retratam tão bem o descontentamento geral existente naquele momento.

    Com tanto material em mãos, Junho consegue ser uma bela síntese sobre o que foram as manifestações de 2013 em suas várias fases. Chama a atenção a pluralidade de depoimentos, vindos tanto de analistas políticos quanto de manifestantes desconhecidos e representante da Mídia Ninja, assim como a diferença de ritmo de narrativa entre as duas metades. Se de início há muita câmera nas ruas e foco na população, depois o olhar muda para o ambiente político e suas reações, naturalmente mais vagarosas. Se falta algo? É claro que sim, afinal de contas é muito a ser dito para apenas 72 minutos. Entretanto, mais até do que uma mera recapitulação, o filme desperta uma reflexão sobre o dia seguinte. Diante da grandiosidade do ocorrido, não apenas pelas reivindicações mas especialmente pela manifestação popular, o que mudou de fato?

    O poeta Sérgio Vaz, bem humorado, resumiu em depoimento dado ao filme: "Acho que o Brasil tem ejaculação precoce. Foi lá, deu uma, isso aqui é revolução e já deu". Entretanto, mais do que respostas concretas - importantes, é claro -, o que já se pode notar é uma mudança de mentalidade. Não é à toa que a Copa do Mundo, em nossa própria casa, tem sido tão pouco esperada pelos próprios brasileiros.

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