Lá e cá
por Francisco RussoParis na França, Nova York nos Estados Unidos, Berlim na Alemanha. Vários são os países que possuem cidades tão emblemáticas que, bem ou mal, tornam-se uma espécie de cartão de visitas ao redor do planeta. O Brasil, país continente, possui duas: Rio de Janeiro e São Paulo. Cidades tão próximas e tão distintas, no modo de ser e de viver, com peculiaridades que, muitas vezes, acirram a rivalidade local. Ponte Aérea, novo filme da diretora Julia Rezende (Meu Passado Me Condena), pretende abordar tais diferenças sob outro ponto de vista: o do amor.
A história gira em torno de Bruno e Amanda, ela paulista e ele carioca, que se encontram graças a um voo desviado para Belo Horizonte. Perdidos em um hotel, se conhecem, se gostam e se amam. Na manhã seguinte, adeus. A noite de sexo tem continuidade quando ele a procura, na saída do trabalho. Inicia ali um relacionamento, repleto de percalços decorrentes não apenas das viagens de uma cidade para outra, mas também da personalidade de cada um. É neste ponto que a relação Rio-São Paulo ganha força, com características de cada cidade sendo transferidas para os personagens.
À primeira vista, Ponte Aérea pode passar a impressão de que generaliza paulistas e cariocas pela forma como são os ambientes tanto de Amanda quanto de Bruno. Entretanto, mais do que ressaltar estereótipos, o longa-metragem quer explorá-los de forma a servir à esta história de amor. Aos poucos se desenvolve uma trama que passa pelo amadurecimento tardio do homem em relação à mulher e ao próprio medo de crescer, quando as obrigações da vida adulta arrombam a porta sem pedir licença para entrar. Ainda assim, são várias as referências a cada cidade, desde elementos paisagísticos até a dicotomia vida apressada/aproveitar a vida, que proporcionam momentos leves, divertidos e até caricatos, mas que tão bem representam Rio e São Paulo. O melhor exemplo é a ótima cena da pizza de calabresa.
Toda esta ambientação é também auxiliada por um verniz cultural aplicado no decorrer de todo o filme, seja com uma piada de fundo pop relacionada à turma da Mônica ou às mais diversas referências culturais, como a exibição de um trecho do clássico Sabrina - analogia indireta ao próprio casal principal – e o gato Fellini. Tudo para retratar – e ressaltar – a classe média alta vivenciada pelos protagonistas, também através da trilha sonora repleta de sucessos pop. Por outro lado, os jargões usados no ambiente da agência publicitária por vezes soam estranhos ao ouvido do espectador, por mais que a presença deles seja fruto do fato de um dos roteiristas do filme, Rafael Pitanguy, vir da publicidade.
Para completar tamanho apuro na confecção deste cenário, Ponte Aérea ainda conta com um casal que convence. Caio Blat e Letícia Colin não apenas compõem bem seus personagens (ela especialmente, que cresce no decorrer da história), como possuem a química necessária para que se acredite neste par. Algo que chama a atenção são as cenas de sexo, longe de serem picantes como as de um Cinquenta Tons de Cinza mas cuja intensidade reflete bem o estado do relacionamento. No fim das contas, trata-se de um filme que diverte pelas situações entre Rio e São Paulo e também surpreende, por oferecer um aprofundamento emocional inesperado em relação aos personagens principais.