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    Cidades de Papel
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Cidades de Papel

    A essência da adaptação

    por Renato Hermsdorff

    John Green fala a língua dos adolescentes. Se havia ficado alguma dúvida depois da adaptação cinematográfica de A Culpa é das Estrelas, o caminho visual feito por Cidades de Papel não o (nos) deixa mentir. E o resultado é uma nova produção, acima de tudo, honesta – sobretudo se comparada com outros filmes direcionados ao mesmo público. Se valendo de grande parte da equipe técnica envolvida naquele que foi o maior sucesso de público no Brasil em 2014, muitos dos elementos presentes lá são repetidos aqui. Com uma diferença substancial, no entanto: Paper Towns (no original), apesar de trazer a assinatura de Green também na produção executiva, é uma livre adaptação do livro.

    Mais uma vez, a história é centrada em um jovem casal (Quentin, Nat Wolff; e Margo Roth Spiegelman, Cara Delevingne); de novo, há um coadjuvante que se destaca (Ben, vivido por Austin Abrams, função que o próprio Wolff desempenhou no filme anterior como o cego Isaac); pela segunda vez, há um empecilho para o romance; e uma reviravolta joga o público para um outro lugar que não o esperado – e esse é o grande diferencial do texto do autor.

    Mantém-se os roteiristas (Scott Neustadter e Michael H. Weber), trocam-se os diretores: sai Josh Boone, entra Jake Schreier, que, no entanto, têm uma característica em comum: ambos são praticamente desconhecidos – trata-se de um filme “de produtores” (novamente Marty Bowen e Wyck Godfrey). O ambiente clínico/ hospitalar de The Fault in Ous Stars (no original) agora é o rico – e superexposto – universo escolar secundarista.

    Margo se muda para a casa ao lado de Q. quando eles ainda são crianças. Rapidamente, os dois ficam amigos e ele passa a alimentar uma paixão platônica pela garota, meio maluquinha. Mas, ao longo dos anos, eles acabam se afastando. Tudo muda numa bela noite em que ela invade o quarto do rapaz, na calada da noite, para pedir a ajuda dele para executar um elaborado plano de vingança. Apesar de ser um cara certinho, ele topa. Acontece que M. desaparece do mapa (literalmente) no dia seguinte, mas não sem deixar pistas. Com a ajuda dos amigos, ele embarca em uma espécie de road trip no encalço do mistério Margo. Até que... o desfecho do filme se distancia do final do livro.

    É uma aposta arriscada, afinal, o livro é um sucesso de vendas e, assim como Q., as pessoas em geral esperam ver ipsis litteris o que leram estampado na tela. Mas o fator surpresa (afinal, “surpreender” não é o que Green faz em sua obra?) é o grande diferencial da adaptação dessa história do autor. Se distanciando do livro literalmente, a equipe do filme se aproximou do escritor em sua essência. Em uma transposição do texto para a imagem, muito é perdido, isso não é novidade. O que Cidades de Papel mostra é que há ganhos também. Dois dos momentos mais engraçados (uma cena que envolve um sotaque estranho e outra que tem a ver com Pokémon), por exemplo, não foram descritos na obra original.

    Embora segurem bem a responsabilidade por seus respectivos papéis, Nat e Cara não têm o mesmo carisma de Ansel Elgort e Shailene Woodley, é verdade. Mas pouco importa. Cidades de Papel, o filme, no fim, atualiza as referências à cultura pop de "Cidades de Papel", o livro (lançado nos Estados Unidos em 2008), mantendo a essência dos personagens bem construídos e divertidos, e apostando em uma história que, apesar de tomar um rumo diferente, o faz de maneira justificada. É o tão explorado rito de passagem para a vida adulta, sem a picardia de um John Hughes, mas com a melancolia de Walt Whitman.

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