Perdidos no reino quântico
por Francisco RussoCom uma década de filmes lançados, a Marvel já deixou bem clara a proposta de trazer características peculiares a cada uma das aventuras estreladas por seus super-heróis, de forma a individualizá-los dentro de um contexto maior. Dentro desta linha, cabe ao Homem-Formiga a conjunção entre temas familiares e um humor um tanto quanto infantil, pelas várias possibilidades envolvendo o tamanho dos objetos e das próprias pessoas. Homem-Formiga e a Vespa segue esta prerrogativa desde a primeira fala, quando ressalta o elo materno entre as duas Vespas, sem deixar de lado a já estabelecida conexão entre Scott Lang e sua filhota e ainda apresentando um terceiro laço, adotivo. Só que, agora, o foco está todo para aquele que promete ser um elemento chave para o futuro do Universo Cinematográfico Marvel: o reino quântico.
Antes de tudo, é bom ressaltar que há bem pouco de Vingadores: Guerra Infinita nesta nova aventura - o elo aqui é bem mais intenso com Capitão América: Guerra Civil. Condenado por ter quebrado o Tratado de Sokovia na emblemática batalha do aeroporto, Scott Lang está em prisão domiciliar por dois anos, com mais três de condicional. Desta forma, teve que dar um tempo na vida de super-herói até que, restando apenas três dias para que possa sair de casa, tem um estranho sonho com Janet Van Dyne (Michelle Pfeiffer), a Vespa original, que se perdeu no mundo quântico há 30 anos. Basta uma ligação e voilá, o trio formado por Lang, Hope (Evangeline Lilly) e o dr. Hank Pym (Michael Douglas) está mais uma vez reunido.
Seguindo a fórmula estabelecida no filme original, o diretor Peyton Reed e sua equipe de cinco roteiristas (!!!) brincam bastante com a possibilidade de diminuir e aumentar objetos inusitados, o que até rende algumas sequências de ação interessantes - todas devidamente reveladas nos trailers, é bom ressaltar. Entretanto, o objetivo maior é fazer rir: não por acaso, o núcleo envolvendo Luis (Michael Peña) e sua equipe ganham imenso (e desnecessário) espaço, com piadas estendidas ao máximo e sempre apresentadas de forma bem didática, menosprezando a capacidade de compreensão do espectador. O melhor exemplo é a situação em torno do soro da verdade, em seus vários momentos.
Soma-se a isto a conveniência do roteiro, em sua (in)capacidade de dar alguma coerência à história em si. Se a vilã Fantasma (Hannah John-Kamen) é mal fundamentada e o também vilão Sonny Burch (Walton Goggins) se repete em uma dinâmica bastante preguiçosa, nada supera o insólito acerca de um prédio que surge e desaparece em diversos pontos da cidade, sem que alguém jamais note tal mudança. Por mais que o efeito seja bacana, e tal mobilidade seja crucial nesta narrativa, tal situação é absolutamente incoerente com a própria característica de ser este um esconderijo dos heróis.
Mas voltemos então ao grande chamariz deste novo filme, o reino quântico. Onipresente na narrativa, ele resulta em cenas até bonitas, que lembram o aspecto visual de Doutor Estranho - sem o mesmo impacto -, apesar de ser mais explorado pelo tom misterioso do que propriamente por seu potencial, o que gera uma certa frustração aos que buscam por indícios em relação ao futuro do Universo Cinematográfico Marvel. Eles até surgem, especialmente na primeira cena pós-créditos, mas pouco revelam.
Anunciado como o primeiro filme da Marvel com uma super-heroína no título, Homem-Formiga e a Vespa chama a atenção pelo escancarado aspecto de parceira dado à personagem de Evangeline Lilly. Basta notar que, com o Homem-Formiga em cena, não cabe à Vespa qualquer definição acerca dos atos principais dos heróis, assumindo de fato o posto de ajudante - postura um tanto quanto contraditória, por sinal.
Com um humor excessivo e poucas cenas de ação, além de muito já ter sido divulgado pelo material de divulgação, sobra a Homem-Formiga e a Vespa o talento cômico de Paul Rudd, que brilha especialmente quando seu trabalho corporal é requisitado pelas mudanças de comportamento do personagem. No mais, trata-se de um filme burocrático que segue à risca a fórmula da primeira aventura do herói, sem ousar um milímetro sequer - algo típico do diretor Peyton Reed -, por mais que traga avanços em relação ao Universo Cinematográfico Marvel - mais em relação à narrativa do Homem-Formiga, é bom ressaltar.