Boyhood é um dos retratos mais intensos e belos já reproduzidos até hoje na história do cinema, presumo. Em anos de experiência, assistindo aos mais diversos gêneros de filmes, aos mais amplificados meios dentro do universo cinematográfico, é a primeira vez que encontro um filme como Boyhood, que alcança a mais breve definição da beleza do que nos rodeia. Um filme que analisa meticulosamente a vida de seus personagens, passo a passo, rodando impetuosamente por 12 anos os mesmos atores interpretando os mesmos personagens. E tudo isso, graças á maestria exuberante e genial de Richard Linklater, um velho conhecido do cinema americano independente desde Slacker, clássico cult, até seu último filme, o dramático e romântico Antes da Meia-Noite.
Não é a primeira vez que Richard Linklater decide fazer uma aventura experimental como Boyhood. Em 1995, o diretor propôs á francesa Julie Delpy, e o americano Ethan Hawke (extraordinariamente impecável em sua performance neste filme) a filmarem, num intervalo de nove anos, uma trilogia. O resultado foi absolutamente impactante, e profundo. Desde Antes do Amanhecer até o recente Antes da Meia-Noite, Richard Linklater dirigiu e escreveu a história de um casal, uma história simples, mas que necessitou de uma aquisição requisitada para equilibrar esse limiar entre a realidade e a ficção. Substancialmente, os três filmes captaram o melhor ângulo do romance, ambientado, a cada filme, numa locação diferente. No primeiro, dois jovens apaixonados em Viena. No segundo, dois adultos procurando se estabelecer no mundo ao seu redor em Paris. No terceiro, um casal de meia-idade sofrendo com a insegurança e instabilidade passando as férias com a família na Ilha do Peloponeso, na Grécia. Filmado por Linklater, essa história não poderia ficar melhor, e acabou funcionando instantaneamente.
Porém, ao lado da trilogia Antes, o projeto ambicioso e quase polêmico de Boyhood foi pretensioso e um pouco arriscado da parte de Richard Linklater: como alguém poderia filmar, por 12 anos, o mesmo elenco interpretando os mesmos personagens, dentro de dentro de diferentes faixas? Esse alguém foi Linklater, que mais uma vez, conseguiu surpreender o público com mais um conto alternativo e raro da realidade. Aqui, a história se passa em um dos cenários favoritos do diretor, Texas. Mason é um garoto que busca se afugentar em um mundo melhor diante da relação conflituosa dos pais separados. Ele vive sob a guarda da mãe, Olivia, insegura e motivada, que apenas quer o bem dos seus filhos. Mason é irmão de Samantha, e ocasionalmente, os dois visitam o pai. Com o início da história em 2002, conforme o tempo avança, o processo do filme se intensifica, e a análise torna-se mais rígida. A mudança, agora, não se centraliza apenas no jovem Mason, mas o mundo que o acompanha. Seus pais, sua irmã, seus amigos, sua nova vida. E a cada passagem no filme, ocorre mudanças na vida de Mason. O segundo casamento de sua mãe com um violento e impotente professor de universidade oferece á Mason a oportunidade de viver em uma catástrofe familiar ainda maior antes da separação de seus pais, em que ambas as famílias sofrem com o distúrbio que degenera o casamento de Olivia e do instável professor. Este é um dos capítulos mais intensos demonstrados ao longo dos 164 minutos do filme. Através da intolerável experiência de Mason com o professor, ele passa a ter momentos complicados, e torna-se uma criança antissocial, tendo contato com poucos de seus amigos na escola, e passando a viver isolado em seu próprio mundo. Após vários problemas, a mãe finalmente consegue seu mestrado e oferece aos filhos uma melhor oportunidade de vida. Enquanto isso, o pai de Mason se casa e tem um filho.
Tudo ao redor do nosso personagem principal muda, mas através disso, o mundo torna-se uma fábula, e Mason torna-se um inevitável herói. A vivência o permitiu presenciar tudo o que a vida é, e tudo o que ela pode ser. Inconstantemente, o roteiro do filme amplia a rigorosa medida que Mason é institucionado, e os limites de sua vida através de seu cresimento, e de sua opinião, seu caráter, sua personalidade. A adolescência, a chegada da maturidade, todos os episódios são etapas que oferecem a nosso herói a vida, da melhor maneira: a pura realidade, a fantasia eterna de se viver, que nunca será demais para os humanos. E neste épico incondicional de Richard Linklater, é narrada uma das mais brilhantes histórias e um dos melhores filmes do cinema contemporâneo. O equilíbrio tênue desta memorável aventura é agradavelmente solene. Em seu (declarado) último filme (e com certeza, o mais inesquecível de todos), Richard Linklater nos presenteia com seu estilo único dentro de uma história essencialmente belíssima, quão triunfante. Boyhood é uma obra-prima visionária e excelente, raramente vista no cinema. Intensamente delicada e emocionante. Boyhood não é apenas uma película, mas uma obra que filma o desenvolvimento humano de uma maneira inquestionável e poderosa, recheada com a fragilidade do tempo e do cotidiano. Sem dúvidas, é uma das observações mais autênticas registradas esse ano. "Você não curte o momento. O momento é que te curte."