É muito comum filmes que tratam do preconceito racial em solo estadunidense ganharem bastante destaque com o público e com a crítica; mas temos que notar que a maioria trata desse assunto como se fosse algo distante, ‘Selma’, ‘Histórias Cruzadas’ e ’12 Anos de Escravidão’ mostram essa prática décadas no passado e sua recepção sempre é comovida, com relatos emocionantes e uma certa “solidarização” para com os descendentes das vitimas dessa realidade horrorosa. Emocionante, eu diria, tudo muito bonito.
Surpreendente é ver que as mesmas pessoas que se comovem e se solidarizam com os negros quando expostas a essas obras, tem virado a cara e repercutido negativamente mundo afora o lançamento de ‘Dear White People’, justamente por que essa nova comédia traz a tona uma verdade que para muitos é um tanto inconveniente, O RACISMO ESTÁ MAIS VIVO DO QUE NUNCA (e não é esse tal de reverso).
‘Dear white people’ acompanha a vida de quatro jovens negros em uma conceituada universidade norte-americana, são eles Sam White (Tessa Thompson), uma ativista radical que comanda um programa de rádio universitário; Troy Fairbanks (Brandon P. Bell), filho de um dos diretores e candidato a presidência de uma fraternidade; Lionel Higgins (Tyler James Williams), um quase jornalista rejeitado pelos colegas; e Coco Conners (Teyonah Parris), uma aspirante a socialite. Durante o andamento do longa vemos a maneira com que cada um deles lida com o racismo que acontece nos corredores da instituição e como ele influencia na vida dos alunos e na sociedade em geral.
O filme é tecnicamente simples, com uma fotografia sem grande destaque e uma montagem segmentada com cortes e transições criativas, mas que por vezes soam deslocadas e confusas. O elenco tem seus momentos, apesar do desempenho quase que propositalmente caricato de alguns, isso por que os diretores Justin Simien e Adriana Serrano devem ter apostado na ideia de hiper-realidade com um pouco de exagero, para não espantar o público e tornar o filme mais denso do que o necessário para passar sua mensagem.
E sim, o foco de ‘Dear white people’ é sua mensagem, ele é crítico e usa o humor de forma correta, com um texto engenhoso e bem escrito escancara o preconceito disfarçado que rege a sociedade “pós-racial” americana (e dá pra expandir esse conceito, inclusive). Ele também mostra a dificuldade de uma juventude que tenta se adaptar em meio a esse universo de hipocrisias e meias-verdades. Seu principal mérito é responder objetivamente aqueles que insistem em pregar a existência do “racismo reverso”, que seria praticado pelos negros, contra os brancos.
— “Seu programa é racista, Srtª. White!”
— “Negros não podem ser racistas. Preconceituosos, talvez, mas não racistas. Racismo descreve um sistema de desvantagem baseado na raça. Negros não podem ser racistas, porque não somos beneficiados por esse tal sistema.”
Resposta que pode se adequar perfeitamente a certas acusações de “heterofobia” ou “cristofobia” que acontecem atualmente em nosso país.
Enfim, em meio a uma série de “tapas-na-cara-da-sociedade", ‘Dear White People’ faz muito bem seu papel e funciona em todas as instâncias que pretende atingir. Filme que vale a pena ser visto.
Vinicius Salazar - Copyright © Taxi Café 2016