Em busca da Terra Média
por Francisco RussoEm tempos onde a busca incessante por franquias, universos compartilhados, reboots, spin-offs e marcas conhecidas se acentua cada vez mais, as cinebiografias têm também servido de porto seguro aos estúdios de cinema. Afinal de contas, tais filmes trazem um certo salvo-conduto decorrente de seu homenageado, apostando que quem aprecia seu trabalho automaticamente também se interesse por sua história de vida. É isto, e apenas isto, que justifica a existência de Tolkien.
Afinal de contas, não há muito a contar sobre a vida pessoal do criador da Terra Média, tão popularizada através dos livros (e filmes) O Hobbit e O Senhor dos Anéis. O jovem J.R.R. Tolkien, aqui interpretado quando criança por Harry Gilby e já adulto por Nicholas Hoult, enfrenta a perda da mãe e as dificuldades de uma juventude sem dinheiro, mas com moradia e alimentação asseguradas, sem qualquer sobressalto. O mesmo acontece quando chega ao colégio e, posteriormente à faculdade, culminando ainda no período em que serviu ao exército inglês, em plena Primeira Guerra Mundial. Momentos marcantes para ele, é claro, mas sem o apelo necessário para uma adaptação cinematográfica.
Diante de tamanha normalidade, resta ao diretor Dome Karukoski apostar nas referências às obras criadas pelo autor - e são muitas. De sua predileção por linguagens ao desenvolvimento de uma por ele criada, o filme tenta justificar o interesse de Tolkien pelo universo da fantasia a partir de uma certa influência materna, que sempre incentivou a imaginação dos filhotes. O mesmo vale para o convívio entre amigos, no colégio e na faculdade, que teria influenciado a criação da famosa Irmandade do Anel. Soma-se a isso breves cenas que buscam a recriação de momentos marcantes dos filmes dirigidos por Peter Jackson, como a saída de casa, quando criança e já no início do filme, cujo enquadramento de câmera é exatamente igual ao exibido ao deixar a casa de um hobbit. Para quem conhece ambas as obras, a associação é imediata.
São tais pequenos fan services que prendem (um pouco) a atenção do espectador - para os familiarizados com as adaptações de Tolkien para a telona, é claro! -, de forma a espalhar ao longo da narrativa uma verdadeira caça ao tesouro, em busca de tais referências. Soma-se ainda o apuro demonstrado em certos aspectos técnicos da produção, especialmente direção de arte e figurino, que chegam a surpreender pelo gigantismo de certos cenários. Por outro lado, há também uma ingenuidade narrativa por vezes incômoda, especialmente na busca do personagem-título por um de seus amigos em plena batalha, na Primeira Guerra Mundial - sempre sem sangue, é bom ressaltar.
No fim das contas, Tolkien é um filme mediano que, se não compromete, entrega apenas um brilhareco decorrente de outras produções. Mesmo seu elenco soa burocrático, capitaneado por Hoult e Lily Collins, com exceção dos jovens intérpretes de Robert Gilson, Patrick Gibson (adulto) e Albie Marber (criança), de onde pulsa algum frescor. Se como narrativa oferece bem pouco, ao menos atende ao interesse (comercial) em faturar alguns trocados a mais a partir da popularidade das obras mais famosas de seu homenageado.