Subsistência
por Francisco RussoO cinema nórdico costuma se valer de tramas muitas vezes áridas, sem o calor humano tão comum aos latinos. Desajustados, coprodução entre Islândia e Dinamarca dirigida por Dagur Kari, segue bem esta linha ao narrar o estilo de vida de Fúsi, um gigante (em tamanho) que, aos 43 anos, ainda não deu seu grito de independência.
Boa parte do longa-metragem se dedica a esmiuçar a personalidade de Fúsi, onde reina a apatia. Por mais que tenha condições de se manter financeiramente, graças ao emprego estável que possui, ainda assim prefere viver com a mãe. Não há propriamente um grau de dependência entre eles, é mais por comodismo mesmo. Fúsi simplesmente não vê motivo para mudar, ele gosta de sua vidinha pacata onde a emoção maior se restringe a brincar com maquetes de grandes batalhas do passado. Segue a rotina dia após dia, sem qualquer reclamação. A seu ver, a vida é boa - por mais que vez ou outra surjam inconvenientes vindos dos "colegas" de trabalho.
O cotidiano de subsistência do personagem principal é refletido também através da fotografia, sempre nublada e sem muitas cores, e pela própria ambientação, gelada e solitária. Não é à toa que um dos "melhores amigos" de Fúsi - se é que dá para chamar de amigo - seja um locutor de rádio, que sabe absolutamente tudo de sua vida graças à paralisia que o cerca. A dificuldade em manter contato, seja verbal ou mesmo físico, é uma característica marcante - e é a partir desta possível quebra que o filme enfim avança.
A vida de Fúsi começa a mudar quando, pressionado pelo namorado da mãe, aceita ir à aula de dança que ganhou de presente. É a primeira vez que o espectador pode vê-lo deixando sua zona de conforto, o que obviamente provoca consequências. É neste ponto que entra o dedo do diretor e roteirista, no sentido de fugir por completo dos tão conhecidos clichês envolvendo pessoas com dificuldades sociais. Só que, ao impôr de forma tão incisiva sua proposta narrativa, isto termina por engessar o longa-metragem.
Sem ter o menor interesse em ser condescendente com seu personagem principal, Dagur Kari apresenta uma sequência de fatos onde a apatia de Fúsi é testada de toda forma, seja pelo lado moral ou por sua própria conduta. Alguns raios de sol que surgem aqui e ali até insinuam uma possível mudança, visualmente falando, mas isto nada mais é do que um blefe. Se é na rigidez de formato que Desajustados se destaca, é também graças a ela que o filme torna-se monótono e, de certa forma, cansativo. Vale ainda destacar o onipresente tom melancólico da narrativa e a boa atuação do protagonista Gunnar Jónsson, sempre no limite entre a apatia e a bondade, segundo seu ponto de vista.