Causando caos, mas com muito estilo
por Katiúscia ViannaBem antes da atual moda de remakes de animações clássicas, a Disney já tinha um live-action famoso: Os 101 Dálmatas, onde Glenn Close imortalizou sua versão de Cruella De Vil nos anos 90. Logo, quando anunciaram o prelúdio Cruella, surgiu uma expectativa ainda maior sobre quem iria interpretar tal personagem. Afinal, as comparações seriam inevitáveis, certo? Errado! Emma Stone surge com uma versão completamente diferente da icônica vilã, mas ainda assim maravilhosa.
Cruella acompanha o início da jornada da personagem-título, desde quando ainda era Estella, uma criança rebelde, até virar uma jovem adulta criativa, que vive de pequenos golpes ao lado de Jasper (Joel Fry) e Horácio (Paul Walter Hauser). Porém, ela tem um talento nato para a moda, algo que chama a atenção da poderosa Baronesa Von Hellman (Emma Thompson), dona de um império e sem nenhum caráter. Mas Estella nem imaginava que teria uma conexão com sua nova chefe, culminando numa série de eventos (e uma guerra fashionista) que farão a protagonista abraçar seu lado perverso e virar Cruella.
Cruella se torna a nova anti-heroína do cinema
A direção fica sob a responsabilidade de Craig Gillespie (do ótimo Eu, Tonya); que surge com uma proposta inusitada, mas previsível: Cruella deixa de ser uma vilã e, basicamente, se torna um anti-heroína. Ela não deixa de ser babaca, porém não tem mais aquela obsessão de matar cãezinhos... Algo que sempre foi meio pesado para o universo mágico da Disney. Aliás, os cachorros tem presença fundamental para a nova história — que até brinca com essa questão de forma bem bacana, apesar do CGI usado nos bichinhos nem sempre funcionar.
O roteiro de Dana Fox e Tony McNamara (que trabalhou com Stone em A Favorita) joga de maneira segura, para poder conquistar todos os públicos. Para isso, investe na outra principal característica da protagonista: a genialidade fashion. É a partir dessa guerra com a Baronesa que o filme (com mais de duas horas de duração!) atinge seu auge; criando uma história de vingança que vai entreter o público, mesmo que desconstrua um pouco de Cruella De Vil.
Mesmo com erros de roteiro, Cruella é absurdamente fashion
Apesar do roteiro fraco, Gillespie tem a honrosa tarefa de equilibrar todos os destaques da produção, sem deixar que um ofusque o brilho do outro. Para começar, o filme é um deslumbre para os olhos e ouvidos: se o design de produção recriar a Londres punk rock dos anos 70, a trilha sonora parece um álbum de melhores hits da década e não decepciona: de Nina Simone a Queen, passando por "One Way or Another" e "These Boots Are Made for Walkin'".
Porém, o longa é fundado mesmo em duas qualidades. O primeiro grande trunfo do filme é saber abraçar a moda. Os figurinos de Cruella e Baronesa são impecáveis obras de arte, que representam bem o contraste entre as duas rivais e ajudam a contar essa história. Dá vontade de ter todos aqueles looks no armário de casa... Eu usaria aquelas roupas absurdas até pra fazer compras no mercadinho da esquina, se tivesse a chance. Ponto positivo para a figurinista Jenny Beavan!
Emma Stone e Emma Thompson são grandes rivais em Cruella
Já a segunda questão é que o filme não funcionaria sem suas Emmas. Stone traz uma versão nova de Cruella. Ela até pode ser mais vulnerável, porém não deixa de ser intrigante. Dá para ver que ela está se divertindo com o caos provocado nas telas e não tem medo de se jogar no excesso para trazer a alma da personagem. Sem falar que a gente sabe que ela tem timing cômico desde A Mentira... E Thompson constrói uma odiosa inimiga a altura da protagonista, colocando a Baronesa no hall da fama das vilãs Disney.
Logo, Cruella não é um filme perfeito, mas cumpre bem sua função de criar algo novo com uma personagem já estabelecida. Brinca com as possibilidades do passado da vilã, só que ainda traz referências ao universo de 101 Dálmatas — vide as presenças de Anita (Kirby Howell-Baptiste) e Roger (Kayvan Novak), por exemplo. Mas se você gosta de moda, música boa, ou é daqueles que adora passar pano pra vilão de ficção... Como não se apaixonar?