Tudo de novo
por Francisco RussoA vida de Jesus Cristo talvez seja a história mais abordada na sétima arte, sob os mais variados enfoques. Desde o didatismo minucioso de Jesus de Nazaré, com mais de cinco horas de duração e dirigido por Franco Zeffirelli, até a sanha violenta de Mel Gibson em A Paixão de Cristo. Em O Filho de Deus, dirigido pelo estreante no cinema Christopher Spencer, a proposta é oferecer ao público cristão um relato convencional do Novo Testamento. Ou seja, não é preciso temer interpretações dúbias ou ousadas.
A proposta aqui é acompanhar a vida de Cristo (o português Diogo Morgado) a partir dos relatos de João (Sebastian Knapp), narrador da história. Após uma breve passagem por fatos marcantes do Velho Testamento, como a gênese, Moisés e Abraão, a narrativa logo salta para Jesus já adulto. Seu nascimento até será abordado mais a frente, em breves cenas de flashback, mas nada muito aprofundado. É a partir do encontro de Jesus com Pedro que começa, de fato, a trama. A escolha dos apóstolos e a iminente pregação são os passos seguintes.
Como cinema, O Filho de Deus traz um grande problema: a precariedade da produção. Seja na caracterização dos personagens ou nos cenários, fica bem explícito que o longa-metragem não teve um orçamento robusto. Este ar meio capenga prejudica especialmente em momentos onde os efeitos especiais são necessários: a sequência onde Jesus anda sobre a água, por exemplo, é tosca. Da mesma forma, chama a atenção a falta de cuidado na caracterização do elenco – todos, de Cristo a qualquer escravo, surgem em cena com dentes branquíssimos! – e em algumas edificações, longe de aparentarem a idade que deveriam ter.
Como pregação religiosa, o pecado cometido pelo filme é mais grave, apesar de ser um tanto quanto sutil. Por mais que acompanhe a vida de Cristo de forma didática, o filme procura dar uma atenção especial aos milagres por ele realizados. Ou seja, seus ensinamentos acabam ficando em segundo plano, citados num diálogo ou outro apenas. Se alguém jamais ouviu falar de Jesus Cristo (se é que isto é possível) e for conhecê-lo a partir de O Filho de Deus, fica a impressão dele ter tido tantos seguidores graças aos milagres realizados, não por toda a filosofia de amor ao próximo por ele implantada.
De resto, O Filho de Deus segue o esperado. Apresenta da pregação à ressurreição de Cristo de forma tradicional, sem grandes pretensões e com um certo ar solene, para que o público possa novamente acompanhar sua trajetória na tela grande. Trata-se de um filme feito para aqueles que não gostaram de Noé apenas por não seguir fielmente os relatos bíblicos. Desta vez está tudo lá, tintim por tintim.