Erotismo brutamontes
por Bruno CarmeloEm plena época de lançamento de Cinquenta Tons de Cinza, os estúdios Universal apostam em outra história erótica destinada às mulheres: O Garoto da Casa ao Lado, nova trama sobre uma mulher frágil (Jennifer Lopez, dessa vez) que não consegue resistir a um homem dominador e musculoso (Ryan Guzman). Mas ao invés de ser punida voluntariamente com chicotinhos e algemas, a professora Claire Peterson é punida com chantagens, fotos eróticas tiradas contra a sua vontade e muito slut shaming.
Ou seja, a história de O Garoto da Casa ao Lado é mais violenta, pelo fato de sair da esfera privada e entrar na esfera pública, castigando a mulher por seu desejo. A história não é muito sutil: Claire é descrita como fragilizada pela traição do marido, e carente de sexo há meses. Duas cenas após a aparição do vizinho, o garoto já se transforma em amante potencial, homem da casa e pai simbólico para o filho de Claire. Tudo de que uma mulher supostamente precisa (sexo com um homem musculoso, um pai para sua prole e um braço para trocar as lâmpadas de casa) é instantaneamente providenciado pela chegada do jovem Noah.
Rob Cohen, diretor dos filmes de ação Velozes & Furiosos e Triplo X, conduz a trama com a delicadeza de um trator. Na primeira cena em que Noah aparece, a câmera fecha o enquadramento no bíceps avantajado do rapaz, antes mesmo de mostrar seu rosto. Quando Claire está usando um peignoir transparente, a câmera fica à altura do chão, para revelar as pernas e a fenda no tecido. É difícil reclamar neste caso que as mulheres são tratadas como objetos, como na maioria dos filmes de estúdio: na verdade, todos são tratados como objetos, tanto o garoto, reduzido a um corpo bruto e cheio de testosterona, quanto a protagonista, mostrada como uma cougar precisando de sexo. Mesmo os coadjuvantes (a vendedora da loja, o ex-marido infiel) aparecem como possibilidade de sedução.
Pelo menos, tamanha brutalidade acaba produzindo duas cenas de sexo provocadoras para os padrões de Hollywood. Quem espera erotismo vai ficar feliz com os enquadramentos focalizando o interior das pernas de Jennifer Lopez, quando Ryan Guzman explora a anatomia da vizinha (cena mostrada duas vezes, aliás), além de um segundo momento de sexo oral. Não há sutileza psicológica, longe disso, mas o fetiche é garantido pelo dispositivo que torna o prazer sempre disponível: as janelas dos vizinhos são face a face (e ambos gostam de andar seminus), as portas dos fundos ficam abertas, máquinas fotográficas e câmeras estão convenientemente instaladas. Todo sexo pode ser visto e descoberto. Esse é o voyeurismo como definição: possuir a imagem sem possuir a coisa representada por esta imagem.
Enquanto isso, a produção faz questão de transformar o projeto em um filme B: as atuações da dupla central são muito fracas, os diálogos entre o garoto obsessivo e a professora zelosa por sua reputação são risíveis, o alívio cômico provocado por Kristin Chenoweth é dos mais simples. A fotografia é bastante escura, a montagem nunca sabe muito bem se tem em mãos um romance, um drama, um suspense ou um terror gore. O próprio diretor não decide se deve direcionar a história para o público feminino ou masculino, e às vezes troca o ponto de vista entre Claire e Noah.
O conjunto é uma bagunça, mas poderia se tornar um cult trash caso assumisse com orgulho sua baixa qualidade. Mesmo assim, o público mais jovem pode ficar interessado na promessa erótica do blockbuster, e fãs de Jennifer Lopez e Ryan Guzman devem apreciar os atributos físicos da dupla. O Garoto da Casa ao Lado torna-se um ensaio sensual recheado com uma pequena história de loucura e obsessão, que vez ou outra sai de sua monotonia pela irrupção de referências a literatura clássica, de corpos caindo do armário e de uma colisão de carro digna de uma comédia pastelão.