Filme de palavra
por Francisco RussoMinutos Atrás é um filme pouco comum no cinema brasileiro. Não propriamente pelo modo como foi feito, já que, como tantos outros, apenas saiu do papel graças ao comprometimento e a brodagem dos envolvidos. Seu diferencial está principalmente no formato, ao apostar numa linguagem verborrágica com os dois pés no teatro. Mais ainda: traz uma ousadia e um apuro técnico poucas vezes vistos no cinema nacional. É esta mistura arrojada que dá ao filme uma beleza que acaba sustentando-o, mais até do que sua própria história.
Dividido em três atos, Minutos Atrás acompanha a jornada de Alonso (Vladimir Brichta) e Nildo (Otávio Müller), dois errantes que viajam sem rumo ao lado do cavalo Ruminante, surpreendentemente interpretado pelo cantor Paulinho Moska. Sim, você leu bem: Moska interpreta um cavalo. Todas as cenas do filme foram rodadas duas vezes, uma com um cavalo de verdade e outra com o cantor em seu lugar - na edição é que foram escolhidas em quais cenas cada um apareceria. Para compor o animal, que não fala com os demais personagens mas volta e meia canta, Moska caprichas nas expressões faciais. Acredite, funciona! A relação de Alonso e Nildo com Ruminante é um dos pontos altos do filme.
Outro destaque é a fotografia, intencionalmente descolorida de forma que o cinza seja valorizado em cena. Com isso, apenas os próprios atores e a carroça que carregam são coloridos, o que traz um visual bastante interessante ao filme como um todo. Também compondo o cenário, há uma riqueza de objetos que cercam os personagens que desperta sempre a atenção sobre sua utilidade neste universo microscópio representado apenas pelos três atores.
Em meio a esta riqueza visual, há também a verborragia do texto - destaque e também ponto fraco do filme. Se por um lado os diálogos exigem bastante atenção do espectador, pelo ritmo rápido com o qual são ditos e também pelo inusitado do texto, por outro cansam em certos momentos. O que ajuda também a segurar o filme é a qualidade do elenco, especialmente Brichta e Müller. Pode-se notar a entrega absoluta de ambos aos seus personagens, com algumas tiradas bem espirituosas.
Minutos Atrás é um filme verborrágico e bastante criativo, mas não é recomendável para todos. É preciso aceitar sua proposta estética para que se possa mergulhar fundo diante de tamanha loucura e, ainda assim, há momentos em que o espectador flutua dentro da narrativa. Merece ser visto pelo seu lado poético e pela coragem, tanto do diretor Caio Sóh quanto do elenco e da equipe técnica por trás de tamanho apuro técnico.