Perdido no Afeganistão
por Francisco RussoA música de abertura "Pop Star", de Cat Stevens, logo de cara dá o tom de Rock em Cabul, graças à repetição dos refrões "Yes, I'm going to be a popstar" e "Yes, I'm going on the TV now". A busca contínua pela fama, seja lá em qual país for, é o mote central desta comédia com cara de drama comandada pelo veterano Barry Levinson, que possui na estante uma estatueta do Oscar por seu trabalho em Rain Man. Por mais que este seja um tema não apenas interessante, mas também atualíssimo, é uma pena que o diretor e sua equipe demonstrem estar completamente perdidos sobre que rumo tomar nesta produção.
Se a presença de Bill Murray como o empresário decadente Richie Lanz de imediato traz o carisma necessário para um personagem ao mesmo tempo cativante e picareta, é impressionante como este potencial é desperdiçado pelo tom equivocado do filme. Assim como em várias outras tentativas em sua carreira, especialmente A Revolta dos Brinquedos e Candidato Aloprado, Levinson demonstra não ter muita afeição à comédia. Sua falta de timing cômico é nítida, seja pelas sequências alongadas além do necessário ou a própria falta de traquejo em relação às poucas boas piadas presentes no roteiro. E olha que estamos falando de ter Bill Murray em cena, fazendo o que pode para prender (um pouco) a atenção do espectador.
Outro problema sério é em relação ao roteiro de Mitch Glazer, que muda de direção a todo instante. De início Rock em Cabul investe forte na imagem decadente de seu personagem principal, levando uma de suas clientes (Zooey Deschanel, em breve participação) para uma furada anunciada no Afeganistão. A proposta é investir no contraste do espírito rock'n'roll em um cenário de guerra, seguindo o exemplo real que aconteceu tantas vezes ao longo da História. Só que Levinson deixa de lado o sarcasmo e o absurdo, preferindo situar o filme em uma base de fundo "realista", mas ao mesmo tempo preconceituosa. Cenas como Murray entregando um pente de plástico a crianças na rua, como se esmola fosse, são de uma arrogância impressionante! Trata-se de Hollywood mais uma vez assumindo estereótipos sobre localidades, de forma que reflitam uma anunciada superioridade perante tudo que a cerca.
Não demora muito e Rock em Cabul já muda de rumo, inserindo uma subtrama envolvendo mercadores de munição. É o momento de Danny McBride e Scott Caan entrarem em cena, em personagens estereotipados que parecem ter saído diretamente de qualquer comédia estrelada por Seth Rogen. É a deixa também para que Bruce Willis enfim apareça, em mais um de seus típicos personagens durões sem qualquer profundidade. Levinson e Glazer não têm o menor interesse em desenvolver o trio, que está lá apenas para conduzir o personagem de Murray à segunda, e última, reviravolta do filme. É quando surge o trecho "baseado em uma história real", ressaltando questões feministas a partir da participação de uma jovem interiorana em um popular reality show musical. Tudo pontuado por verdadeiros hinos do rock'n'roll, que surgem aqui e ali, como "Smoke on the Water".
Ou seja, Rock em Cabul é uma imensa bagunça, não apenas por mudar de foco a todo instante mas também por não conseguir desenvolver nenhum deles a contento. Subtramas e personagens são inseridos e abandonados de forma absolutamente gratuita, com o filme apostando em um único trunfo: o carisma de Murray. Ele faz o que pode, mas também sucumbe diante de tantos problemas de roteiro e direção.