Pura imaginação
por Lucas SalgadoLançado em 2011, Thor tinha uma pegada de humor, romance e ação bem equilibrada, além de uma trama shakespeariana que trabalhava bem a relação entre os irmãos Thor e Loki. Era um bom filme de origem que se encaixou bem com o primeiro Vingadores. Dois anos depois foi a vez de Thor: O Mundo Sombrio chegar aos cinemas. E o resultado não poderia ser mais catastrófico, contando com uma trama genérica e um vilão que provavelmente você nem lembra mais. E fez bem de ter esquecido.
Levou quatro anos para o personagem ganhar um novo filme solo. E valeu a pena esperar. Após os sucessos indies O Que Fazemos nas Sombras e Uma Fuga Para A Liberdade, o diretor Taika Waititi ganhou a oportunidade de comandar seu primeiro blockbuster. E o resultado foi bem satisfatório.
Após a demissão de Edgar Wright de Homem-Formiga, parecia que a Marvel não estava com a cabeça muito aberta para mentes criativas, queria mais o básico. Felizmente, isso começou a mudar com James Gunn em Guardiões da Galáxia e é ratificado aqui. Waititi teve a liberdade de fazer de Thor: Ragnarok um filme repleto de humor e personalidade.
Neste sentido, é interessante notar que Thor 3 é quase uma comédia, uma vez que boa parte das piadas são feitas por seu protagonista. Em determinado momento, há até um exagero no humor, com diálogos presentes apenas para levantar a piada. Por outro lado, há uma ótima interação entre os personagens, gerando cenas marcantes entre Thor e Loki e, principalmente, entre Thor e Hulk.
No início da trama, vemos Thor e o irmão voltando para a Terra para procurar o pai, Odin, numa continuação do que aparece na cena pós-crédito de Doutor Estranho. A participação de Benedict Cumberbatch é simpática, servindo mais para unir o universo Marvel, além de oferecer uma simpática referência a Sherlock.
Após isso, acompanhamos o surgimento de Hela e acabamos com Thor em um planeta estranho sendo obrigado a enfrentar o ex-amigo de trabalho Hulk. A vilã vivida por Cate Blanchett é visualmente encantadora, mas falta um pouco de profundidade. A atriz tem uma presença em cena incrível, surgindo realmente ameaçadora, mas sua trama é pouco explorada. Por outro lado, a presença de Hulk é um dos pontos altos da produção. O personagem é realmente aproveitado pela primeira vez no Universo Marvel, não sendo apenas uma máquina de destruição.
Chris Hemsworth e Tom Hiddleston seguem com uma ótima química em cena e agora surgem mais divertidos do que nunca. Por sinal, Loki está um personagem cada vez mais complexo, não sendo somente aquele grande vilão, ser todo poderoso. Está claro o efeito que as derrotas passadas causaram nele. A dupla conta com a companhia de Mark Ruffalo e Tessa Thompson na formação de uma nova equipe do universo Marvel.
Outra novidade no time é a presença de Jeff Goldblum como o Grão Mestre, uma figura quase como Willy Wonka, etéreo, colorido e por vezes ameaçador. Destaca-se ainda duas participações especiais pra lá de divertidas e surpreendentes.
Se por um lado o longa exagera no humor, por outro oferece cenas de ação bem competentes. Sem querer alfinetar o universo DC (mas já alfinetando), faz muita diferença o fato da maioria das cenas de ação se passarem durante o dia. Isso fica claro no confronto final, que é praticamente a mesma luta genérica de sempre, mas que ganha força ao oferecer diversos elementos que o espectador pode aproveitar. Não é apenas aquele borrão.
Em companhia do diretor de fotografia Javier Aguirresarobe, dos montadores Zene Baker e Joel Negron, e do compositor Mark Mothersbaugh, Taika Waititi criou uma experiência quase oitentista. Não é nostálgico como Guardiões, mas esteticamente remete muito aos anos 80, especialmente Tron, na forma como trabalha uma experiência sonora e visual que é quase uma balada eletrônica. A diferença é que é mais psicodélico.
Além da trilha original, destaca-se ainda a seleção musical, que vai de "Immigrant Song" até "Pure Imagination", tema de A Fantástica Fábrica de Chocolate - alguém falou em Willy Wonka? Com relação à clássica música do Led Zeppelin, o uso é bem eficiente nas cenas de ação, embora lembre muito a trilha de Mulher-Maravilha.
Thor: Ragnarok tem como principal mérito o fato de não se levar a sério. E isso não tem relação nenhuma em ser mal feito. Apenas sabe que sua função básica é entreter e desenvolver o universo. Agora é esperar por Vingadores: Guerra Infinita.
Falando nisso, o filme conta com duas cenas pós-crédito. A primeira é um importante elo com o próximo longa do grupo de heróis. Já a segunda é apenas uma piadinha pra lá de esquecível.