Sociedade Animal.
É inegável que a Disney tenha criado história no cinema com mundos repletos de personagens coloridos, vilões caricatos, músicas cantaroladas e diversos outros elementos característicos do estúdio, porém, assim como o mundo globalizado se adequa a novos formatos, os produtores também buscam a diversidade em prol do que é contemporâneo, assim nasceu o fantástico Zootopia.
A história gira em torno de uma pequena coelha chamada Judy Hopps, cujo sonho alimentado desde a infância é se tornar uma policial na grande cidade Zootopia. Embora não tenha o incentivo dos pais acomodados, a pequena segue seu sonho e alcança o posto de investigadora na cidade que dá nome ao filme. É no mesmo local que também conhece Nick Wilde, uma raposa inescrupulosa que ganha a vida na base de trapaças. Quando ambos tem os caminhos cruzados, percebem que precisam se ajudar para desvendar um complexo caso que tem assolado a cidade e alterado o comportamento de animais felinos.
Logo no primeiro momento da animação já percebemos algo a mais na história, visto que Hopps discursa sobre como grandes animais aprenderam a conviver harmoniosamente com os menores, ainda que no passado a cadeia alimentar determinava o contrário. Essa aspecto social chama a atenção pela forma como é tratado ao longo da ventura, gerando momentos em que o preconceito e a segregação pairam de forma delicada e ingênua aos olhos dos pequeninos que assistem, mas agregam um valor narrativo fenomenal ao filme.
Essa tratativa é inclusive salientada muito bem em uma frase do vilão: "apesar de vivermos em sociedade, a vida selvagem ainda está em nosso DNA". Não há dúvidas que isso também é um reflexo evidente de como a sociedade tem se comportado com sua suposta evolução, haja vista que guerras e problemas relacionados a violência, muitas vezes banais, continuam presentes no âmago universal.
Zootopia também tem outros trunfos na manga, como por exemplo o design de produção. David Goetz é sagaz ao criar um universo no qual a cidade fora criada por animais para animais, isso permite moldar até mesmo ambientes voltados a tamanhos e formatos bem característicos das espécies, algo que fica bem nítido, por exemplo, nas entradas do metrô. O próprio habitat que subdividi-se em distritos chama a atenção devido a sua geografia e respeito pelos animais, como é o caso de Tundralândia e seus gélidos ambientes, ou mesmo o Distrito Florestal com sua tropicalidade brilhante.
Mas, mesmo em uma grande cidade povoada por "animais", temos também presente o controle de uma certa minoria. Para os adultos, ficará evidenciado que na sociedade reina o controle provido pelos políticos, cujos interesses muitas vezes se sobrepõe à razão pela qual ocupam seus cargos, novamente, uma retratação brilhante do mundo atual, porque não dizer, na realidade brasileira. Também há destaque sutil nas "forças" que deveriam servir como protetores da população, mas fazem uso da força e muitas vezes da violência para manter as coisas em "ordem".
Mantendo a qualidade de roteiro e animação em voga desde sua chegada, John Lesseter mais uma vez prova que sua consultoria tem surtido efeito notório no resultado final dos filmes da Disney. ZOOTOPIA mostra-se funcional em diversos sentidos, inclusive naquelas em que joga abaixo os antigos conceitos de fragilidade feminina tão utilizados pelo estúdio. Claro que o filme vai além do esperado, mantendo uma crítica social pontual e delicada, sem jamais soar ofensivo ou desagradável para todo o público, inclusive com piadas inteligentes e bem aplicadas ao contexto narrativo, haja vista a profissão de um certo personagem chamado Flecha, fenomenal.