Criar filhos para o mundo
por Bruno CarmeloO cinema independente está repleto de narrativas que abordam a passagem à fase adulta pelos olhos de algum adolescente angustiado. Poucas são as produções que, como Club Sandwich, dividem o ponto de vista entre as descobertas do jovem e aquelas da mãe, vulnerável por simbolicamente perder o seu filho para o mundo adulto - sobretudo numa produção tão minimalista, dispondo de apenas de três personagens e três cenários.
Estamos no terreno de conforto do mexicano Fernando Eimbcke, conhecido por abordar temas complexos com o mínimo de elementos possíveis – o tédio da classe média através de quatro personagens em Temporada de Patos, o luto através de três jovens em Lake Tahoe. Ao contrário de produções que explicitam suas discussões em diálogos (como Las Insoladas), esta comédia dramática explora bem os silêncios e os momentos de desconforto. Na trama, uma mãe progressista e fã de rock cria sozinha o tímido filho de 15 anos de idade. Ambos partem para um hotel pequeno e vazio, até que uma garota apareça no local e chame a atenção do jovem.
O roteiro está repleto de gags divertidas (o ventilador, o mosquito que só pica a mãe, o sanduíche do título) expostas em tom simples, com cores pouco saturadas e narrativa linear. O cineasta não cria imagens excepcionais, mas faz uso expressivo dos recursos à disposição. Eimbcke trabalha com diferentes profundidades de campo e com espelhos no fundo do enquadramento refletindo partes distintas de um mesmo cômodo. A simetria e as repetições são usadas com notável domínio cômico e estético.
Apesar de tanta leveza, Club Sandwich não é condescendente com os personagens, nem com o espectador. A relação entre a mãe Paloma (Maria Renée Prudencio) e o filho Héctor (Lucio Giménez Cacho) é complexa, marcada por momentos de tensão e desejo sexual. Mãe e filho se tocam sempre, comentam sobre as roupas íntimas um do outro, e enquanto ela dorme, ele se masturba na cama ao lado. Ao mesmo tempo, a mãe se contorce com um sonho erótico. Na cena seguinte, Jazmin (Danae Reynaud) se senta com Héctor na mesma cama em que foi concebida por seus pais. Existe forte carga sexual nesta produção em que a masturbação mútua ocorre antes do primeiro beijo. Psicanalistas devem se deliciar com o teor incestuoso da relação.
O clímax apresenta a melhor cena de todo o filme. Para não estragar a descoberta, basta dizer que um jogo entre os personagens desperta o melhor e o pior de cada um, expondo os ciúmes, a raiva, a inveja e a solidão. É um momento de excepcional poder de síntese, com poucos diálogos e pouco movimento. Eimbcke aproxima, pela primeira vez, a câmera do rosto de seus atores, como se quisesse sorver os sentimentos tão claros em cada rosto. Esta cena marca o encontro entre um roteiro afinadíssimo, uma direção segura e modesta, e a atuação magistral de Prudencio.
Club Sandwich poderia passar despercebido pela pequenez de suas dimensões e pelo tema comum. Mas a história esconde um humanismo complexo por trás da embalagem despretensiosa. Este é um destes pequenos grandes filmes, que crescem na cabeça do espectador muito tempo após a sessão.