Zoando os ninjas
por Francisco RussoNo mundo das marcas adaptadas para o cinema, a Lego encontrou uma saída inusitada (e esperta) ao associar a estética dos seus bloquinhos de montar a um ritmo surtado e sarcástico, sem o menor medo de tirar sarro com ícones consagrados. Desta forma, após dedicar um longa-metragem inteiro a revisitar a memória do Homem-Morcego nos quadrinhos, na TV e no próprio cinema, chegou a vez de mirar o holofote para outro ambiente facilmente identificável: as aventuras envolvendo ninjas. Só que, ao contrário do visto em Uma Aventura LEGO e LEGO Batman, o resultado não é tão inspirado.
A coesão narrativa destes três filmes situados em um mesmo universo cinematográfico é escancarada logo de início, seja no trecho live-action ou na própria animação. As já conhecidas piadas ágeis apresentadas em linguagem pop surgem logo no primeiro frame de LEGO Ninjago, a partir da bem-humorada brincadeira de que o filme será exibido "in Lego-scope". Se a presença de atores causa uma certa surpresa, esta tem por função inserir a animação que vem a seguir na clássica mecânica do mestre/aprendiz, tão comum em filmes do gênero, além de dialogar com a dinâmica existente em Uma Aventura Lego, quando o mundo real interage com o construído a partir de Lego. A coexistência de ambos permite o rompimento de barreiras de lado a lado, fazendo com que, por vezes, o filme como um todo remeta ao nonsense típico de cartoons clássicos.
Quando a animação enfim começa, o espectador de imediato é tragado por um delicioso olhar exagerado e sarcástico acerca do mundo que nos rodeia, tão bem explorado em Uma Aventura Lego. A apresentação de Ninjago a partir de um programa sensacionalista que "acompanha 24h o covil do vilão", sempre em tom histérico, provoca um imediato paralelo com a estética youtuber que migrou para a mídia tradicional. A ágil apresentação dos personagens principais a partir de mais um ataque do megavilão Garmatron - atenção para o "mais um", detalhe importante para a dinâmica deste universo -, funciona bem tanto pelo lado da ação quanto da diversão, a partir das breves piadas em torno da estética Lego. Até então, tudo funciona muito bem em Lego Ninjago.
Só que, pouco a pouco, o filme perde ritmo e, também, interesse. À medida que a narrativa é melhor desenvolvida, a partir da lacuna emocional deixada no jovem Ninja Verde por ter sido abandonado ainda bebê pelo próprio pai, o vilão que tanto combate, o filme recorre a clichês batidos envolvendo não só o relacionamento entre pai e filho como, também, o universo dos ninjas. A repetição desenfreada atinge até mesmo a estética Lego, com a presença cada vez mais rara de situações inspiradas e mesmo das referências pop, que tanto marcaram a franquia. É como se a inspiração, subitamente, tivesse acabado.
Com uma metade final extremamente arrastada, Lego Ninjago perde força de uma maneira impressionante. Por mais que ainda traga ecos dos Power Rangers na construção do grupo ninja e beba de uma estética consagrada, o abandono do ritmo frenético e do olhar sarcástico em detrimento de uma história mais melodramática cobra seu preço. Também porque os personagens centrais não são tão emblemáticos assim e sequer são bem desenvolvidos - com exceção do Ninja Verde e de Garmatron, pouco se sabe dos demais além de seus poderes.
Apesar da irregularidade e de ser inferior aos filmes Lego anteriormente lançados, Lego Ninjago possui bons momentos, especialmente na meia hora inicial. Destaque para o belo trabalho de Eduardo Borgerth na voz nacional do vilão Garmatron e para a adaptação dos diálogos para o linguajar popular brasileiro, que resultou em bem inseridas pérolas do nosso cotidiano.