São nas adversidades e, algumas vezes, em pessoas que não inspiram muita confiança, que a coragem e o senso de dever afloram. Essas são as premissas iniciais do surpreendente filme Horas Decisivas, do diretor australiano Craig Gilesppie (Em Pé de Guerra).
Bernie Weller (Chris Pine, da franquia Star Trek) é um oficial da guarda costeira dos EUA relutante, mas muito eficiente, que sempre segue os regulamentos e vive em uma pequena cidade do litoral de Massachussets, ao norte do país. Ele tem um relacionamento com a bonita Miriam (a inglesa Holliday Granger, de Cinderela), de personalidade forte e que trabalha como telefonista. Ambos se conheceram em 1951, em um encontro às escuras, apaixonaram-se à primeira vista, namoraram durante um ano e ficaram noivos.
Em 1952, o navio petroleiro SS Pendleton retorna para casa em meio a uma terrível tempestade, que acaba por, literalmente, rachar o navio ao meio. Com apenas metade do navio e da tripulação, o impopular engenheiro-chefe Ray Sybert (Casey Affleck, de O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford) assume o comando e tenta levar o que sobrou da embarcação o mais próximo possível da costa para que sejam resgatados.
Ao tomar conhecimento do acidente, o comandante da guarda costeira Daniel Cluff (o australiano Eric Bana, de Tróia) ordena que Bernie constitua uma tripulação para resgatar a tripulação do Pendleton. Entre os escolhidos está o oficial Richard Livesey (Ben Foster, de O Grande Herói) que não confia em Bernie devido a um erro que este cometeu no passado. Os oficiais devem correr contra o tempo e o furioso temporal para poderem efetuar o resgate.
Baseado no livro The Finest Hours, dos escritores estadunidenses Casey Sherman e Michael J. Tougias, Horas Decisivas foi uma surpresa para mim em todos os sentidos. Confesso que achava que seria apenas mais um filme de ação como dezenas de outros que aparecem todos os anos, mas, para grande satisfação minha e dos apreciadores de um bom filme, Horas Decisivas vai muito além.
Craig Gilesppie é ainda um nome não tão conhecido do grande público em geral. Começou sua carreira na publicidade – fazia comerciais de televisão – e seus trabalhos mais conhecidos no Brasil são a série de TV United States of Tara (2009-2011) e o remake d’ A Hora do Espanto (2011). Ainda não é considerado um nome do primeiro time de Hollywood, mas, após este filme, é bem possível que essa situação mude.
Seu trabalho de direção está firme e seguro na direção de atores e nas cenas de ação que, aliás, são emocionantes. É um trabalho na medida certa, que não torna o filme piegas ou exagerado no geral, no que é auxiliado pelos excelentes efeitos especiais tanto nas tomadas submarinas quanto nas de superfície, na fotografia do espanhol Javier Aguirresarobe (Vicky Cristina Barcelona) e na trilha sonora de Carter Burwell (Carol).
Chris Pine está muito bem no papel de Bernie, alguém humano, que segue regulamentos à risca, seja no trabalho ou na vida privada. Chega a duvidar da própria competência devido a um erro do passado que o atormenta, mas é alguém altamente cioso de seu dever e consciente que este deve ser cumprido, mesmo com o risco da própria vida. Parece que Chris nasceu mesmo para ser capitão (nos filmes, bem entendido).
Casey Affleck (irmão de Ben Affleck, de Batman vs Superman) também está ótimo no papel do engenheiro-chefe Ray Sybert, um homem mais afeito às máquinas do que às pessoas, o que não o torna muito simpático entre os tripulantes do Pendleton. Assim como Bernie e à sua maneira, é também alguém cioso e consciente de seu dever para com a tripulação, o que o leva a conflitos com alguns tripulantes que não confiam nele, também do mesmo modo que Richard não confia em Bernie.
Esse paralelo de semelhanças entre Bernie e Ray é uma boa sacada do filme e faz com que os dois personagens de personalidades diferentes se aproximem.
Entre os coadjuvantes, há dois que se destacam. O primeiro é o escocês Graham McTavish (saga O Hobbit), como o experiente marujo do Pendleton Frank Fauteux, chamado de “Pops” pelos tripulantes. Os tradutores foram muito infelizes em traduzir a palavra “Pops” como “coroa”. “Pops”, na verdade, é um diminutivo de pai e pode ser traduzido como “paizinho” ou “papi” (como no filme O Exterminador do Futuro: Gênesis) e é usado de forma carinhosa para o próprio pai ou alguém mais velho. Que mancada!
O outro coadjuvante de destaque é Abraham Benrubi (da série de TV Plantão Médico) no papel do cozinheiro grandão, cantador e simpático “Tiny” Myers. Esse apelido foi uma boa piada, pois, em inglês, “Tiny” significa “pequeno”.
O único porém do filme foi com relação a dois personagens cuja importância foi diminuída por parte de um e aumentada por parte de outro.
O personagem de Eric Bana, o comandante Daniel Cluff, é visto apenas como o chato do filme, cujo sotaque recebe a implicância de todos quando, na vida real, sua importância foi bem maior. Foi uma pena e um desperdício usarem um ator bom como Bana de um modo tão reduzido assim.
Já Miriam, a personagem de Holliday Granger, ao contrário de Cluff, teve sua importância excessivamente aumentada. Ela faz bem sua personagem de forte personalidade, mas achei forçada a cena na qual é ela quem tem a ideia de ajudar o barco de Bernie a voltar para a costa. Além do mais, achei que ela estava maquiada e vestida mais como uma estrela de cinema da época do que uma jovem da Classe Trabalhadora. Não que isso seja um demérito em si, mas tirou um pouco do realismo.
Colocando tudo na balança, ela pende mais do que a favor. Horas Decisivas é um filme com grandes e fortes emoções, que vai, certamente, agradar ao público e é candidato a ser uma das grandes surpresas da temporada de cinema de 2016. Podem assistir sem receio, pois a diversão é garantida.