Terror sem limites
por Bruno CarmeloO projeto deste filme é bastante curioso: reunir 26 jovens diretores e pedir a cada um para fazer um curta-metragem de terror sobre maneiras de morrer – um filme para cada letra do alfabeto. O formato escolhido gera apreensão: com duração média inferior a cinco minutos por episódio, como realmente despertar medo e explorar o tema de maneira satisfatória? O terror não seria um gênero extremamente dependente do contexto, exigindo mais tempo para o desenvolvimento da história?
No entanto, diante do resultado final, estas primeiras reticências desaparecem. A média das produções apresentadas é boa, e muitos diretores conseguem fazer uso inteligente de seu tempo e orçamento. Curtas-metragens como o atmosférico Knell (algo como “Badalada”), de Kristina Buozyte e Bruno Samper, e o inteligente Vacation, de Jérôme Sable, poderiam existir de maneira independente, concorrendo em festivais tradicionais de cinema. O episódio brasileiro Jesus, de Dennison Ramalho, também explora o tema espinhoso da religião de modo destemido e visualmente interessante.
Os problemas do filme são outros, relativos à produção. Os idealizadores do projeto afirmam que os cineastas tiveram liberdade total para criar os seus filmes, e isso não é difícil de imaginar, tamanha é a disparidade entre cada segmento. Alguns deles ostentam um orçamento confortável e equipamentos mirabolantes (como os efeitos de grua em Amador), já outros parecem ter sido feitos de modo caseiro (a exemplo de Legado). Alguns são trash e sanguinolentos, outros lembram o suspense mais convencional. Em alguns casos, até a pertinência ao gênero terror pode ser questionada, como no drama de guerra Falling.
Muitos cineastas sequer respeitam a premissa inicial, no que diz respeito às letras e às maneiras de morrer. É visível que certos curtas foram concebidos antes mesmo da atribuição de uma letra, sendo posteriormente encaixados no tema com a ajuda de algum malabarismo lexical – caso dos pouco convincentes P-P-P-P Scary! e Despojado, títulos genéricos para histórias igualmente genéricas. Muitas das palavras-chave escolhidas pelos diretores não dizem respeito à maneira de morrer, apenas a um objeto ou um pequeno símbolo presente na história.
O ABC da Morte 2 conseguiu reunir um bom grupo de diretores, com notável vigor e criatividade na abordagem do gênero. Mas faltou a figura do produtor capaz de federar estas múltiplas visões, conferir coesão ao conjunto e garantir a pertinência de cada história ao projeto. É sempre válido contar com diferentes estilos, contanto que os diretores não queiram se sobrepor ao filme, usando a oportunidade para exibir seus talentos pessoais.
No final, a projeção é disforme, inconsistente, hesitando entre adotar as regras estéticas e comerciais de um filme B ou trilhar os caminhos do circuito de arte. O ABC da Morte 2 fica preso entre sua premissa instigante e a inevitável sensação de representar um catálogo um pouco aleatório de novos talentos do cinema de terror.
Filme visto no Festival do Rio, em setembro de 2014.