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    Quando Meus Pais Não Estão em Casa
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Quando Meus Pais Não Estão em Casa

    Tempos de crise

    por Bruno Carmelo

    É interessante assistir ao drama de Singapura na época em que as classes privilegiadas brasileiras começam a importar e explorar a mão de obra filipina. O filme aborda uma história semelhante: a jovem Terry (Angeli Bayani) deixa o filho pequeno nas Filipinas para cuidar da criança alheia em Singapura, onde existem mais ofertas de emprego. Ela é acolhida por uma família de classe média-alta, também enfrentando uma crise econômica no próprio país.

    O diretor Anthony Chen faz um retrato desolador do capitalismo atual. As grandes empresas estão demitindo funcionários em massa, empresários estão cometendo suicídio e charlatões com segredos para o enriquecimento florescem em cada esquina. Os trabalhos ilegais e a exploração da mão de obra se acentuam. Quando Meus Pais Não Estão em Casa não busca as causas ou implicações políticas desta situação (o governo está convenientemente ausente), mas retrata as suas consequências diretas no microcosmo do lar onde convivem dois pais privilegiados, uma babá desfavorecida e uma criança ingênua – ou seja, um caldeirão exemplar para retratar diferenças de classe e de ponto de vista.

    As imagens demonstram carinho e respeito por todos os personagens, mas o potencial humanista é diminuído pelo viés excessivamente pedagógico. Por exemplo: dentro de uma empresa, logo após revelar uma demissão de maneira próxima e barulhenta, a câmera flagra os funcionários dizendo “É, a situação não está fácil”, e depois acompanha o homem demitido liberando a sua raiva na garagem. As dificuldades da família são aumentadas por inúmeras reviravoltas destinadas a retirar dinheiro do casal já em dificuldades: eles gastam dinheiro com um guru charlatão, contratam a empregada que não podem mais pagar, têm que cuidar do pequeno filho que se acidenta.

    Neste drama familiar, os melhores momentos ocorrem ironicamente longe da família. Quando Terry obtém um segundo emprego em um centro comercial, a câmera fica à vontade em meio à multidão, espelhando a situação da protagonista nas outras ao redor. Dentro do lar, reina o maniqueísmo com a presença da amável e persistente imigrante diante da mãe desumana e do garoto mal comportado. Foi preciso a Chen acentuar as qualidades e defeitos de seus personagens para tornar a mensagem sobre a desumanização mais clara. Ele certamente transmite seu discurso, mas transforma os personagens em sintomas ao invés de pessoas de carne e osso.

    Apesar da construção rasa do núcleo familiar, os atores se saem bem em seus papéis, especialmente Angeli Bayani. Constituindo uma presença passiva (em função de sua posição precária dentro do lar), ela se sai muito bem quando tenta impor regras ao garoto hiperativo. Yann Yann Yeo, no papel da mãe autoritária, faz o que pode para humanizar a personagem, especialmente rumo ao final. O próprio garoto, supostamente a presença mais importante desta história, torna-se coadjuvante da trama, já que a história nunca é vista por seus olhos. Ele funciona como um obstáculo suplementar, uma provação que a babá deve enfrentar para manter seu emprego e conseguir o tão suado salário.

    É interessante que um raríssimo drama de Singapura chegue aos cinemas brasileiros – certamente o cobiçado prêmio Caméra d’Or no festival de Cannes facilitou este percurso. Para além de seu didatismo, Quando Meus Pais Não Estão em Casa estabelece um diálogo direto com a realidade de outros países em rápido desenvolvimento econômico e precarização de relações individuais e trabalhistas – como é o caso do Brasil. Nosso cinema tem oferecido filmes mais profundos sobre questões semelhantes (vide Casa Grande e Que Horas Ela Volta?), mas em conjunto, estas obras compõem um belo painel reflexivo sobre um longo e duradouro estado de crise.

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