Prato cheio de boas reflexões
por Roberto CunhaDiz a sabedoria popular que o peixe morre pela boca e para uma esposa conquistar o marido, um bom prato é o melhor caminho. Lunchbox não esconde ter bebido nesta fonte e apresenta um drama delicioso com pitadas de comédia e romance, tendo como coadjuvante o secular, complexo e praticamente infalível (segundo a conceituada Harvard) sistema de entrega de marmitas de Mumbai. São os Dabbawallahs, que permitem que milhões de maridos possam saborear a comida de casa, durante o expediente.
A história gira em torno de uma dona de casa infeliz, que pretende mudar o presente dando uma temperada no casamento, e um viúvo solitário e trabalhador, preso ao passado, cujo futuro próximo é a aposentadoria. Os dois não se conhecem, mas o destino deles se cruza, quando ela envia uma comida especial para o maridão e a marmita vai parar na mesa do ilustre desconhecido. Quando o esposo chega em casa e não comenta nada sobre os quitutes, no dia seguinte, ela envia um bilhete junto com a comida e recebe um outro, só que do estranho. Cientes da falha, eles começam uma inusitada troca de conselhos e essa amizade singular provoca mudanças na vida deste dois prisioneiros de suas realidades. Mas e se eles se conhecessem, pessoalmente, como seria?
Fora do estilo Bollywood tão comum em seu país, o cineasta indiano Ritesh Batra estreia com pé direito em um longa metragem super inspirado. Visualmente, existem sacadas bem legais e a sequência com a câmera acompanhando a incrível trajetória da marmita pelo tal sistema de entregas é estonteante. Sobre a trama, o roteiro de Batra é inteligente, bem montado, e provocante, fazendo você pensar em vários temas do cotidiano na Índia atual, mas aplicáveis em qualquer parte do mundo. Estão lá a saudade, solidão, competição, velhice, vaidade, juventude, depressão, modernidade... E isso tudo, veja que bacana, através da escrita, em plena era de e-mails, SMS, chats etc. Além desse charmoso ingrediente, o bom humor vem como tempêro extra, na voz de uma tia hilária (espécie de "consultora" da sobrinha) e também na figura do trainee, um órfão que irá substituir o veterano e acaba sendo "adotado" por ele.
Com orçamento estimado em apenas US$ 1 milhão e elenco super coeso, capitaneado por Irrfan Khan (As Aventuras de Pi), essa coprodução Índia, Alemanha, Estados Unidos e França, conquistou prêmios em vários festivais na Ásia e também na Semana da Crítica, em Cannes 2013. Assim, para fechar a tampa, Lunchbox tem bom ritmo, tem surpresas e é um prato cheio para quem gosta de sair do cinema com aquela sensação de ter visto um ótimo filme, pela maneira como os assuntos, muitas vezes até tristes, foram tratados e levaram a uma boa reflexão. É programão pra lá de simpático para se fazer A2, A3, A4...! ;)