Um novato na guerra
por Francisco RussoFilmes sobre a Segunda Guerra Mundial são quase um subgênero dentro do cinema, e não é por acaso. Existe neles uma certa facilidade em contrapor mocinhos e bandidos, graças aos crimes humanitários cometidos pelos nazistas, que estão sempre presentes no imaginário coletivo. Em Corações de Ferro, o diretor e roteirista David Ayer utiliza esta informação prévia com moderação. Por mais que a Segunda Guerra Mundial traga de antemão tal ambientação, é no combate entre homens e seus reflexos psicológicos que ele está mais interessado. Especialmente no horror que a guerra traz.
Não é à toa que o personagem principal do longa-metragem seja Norman (o competente Logan Lerman), um jovem recruta temente a Deus que cai de para-quedas no campo de batalha. Pouco habituado à realidade nua e crua, ele sente o baque e, aos poucos, constrói uma certa carcaça para sobreviver. Corações de Ferro acompanha todo este período de transição, da ingenuidade à constatação do quão dura é a vida – especialmente aquela vida. E, neste sentido, pouco importa o contexto da Segunda Guerra Mundial – poderia ser qualquer outra, sem dificuldade alguma. É a realidade da guerra que está em foco, qualquer uma onde haja combate corpo a corpo entre pessoas.
Diante desta situação, o diretor constrói a transformação de Norman a partir de seus companheiros de tanque, os embrutecidos personagens de Brad Pitt, Shia LaBeouf, Michael Pitt e Jon Bernthal. Por mais que cada um tenha peculiaridades próprias e necessidades distintas que muitas vezes os colocam em choque, há também a união típica de quem necessita de apoio para suportar tudo aquilo. Não apenas no campo de batalha, para derrotar o inimigo, mas também no lado emocional. A dinâmica desta tropa é o que há de mais interessante no longa-metragem, pelas questões levantadas a partir de situações absolutamente cotidianas em um cenário de guerra. Como você reagiria diante de tal situação?, o espectador pode se perguntar em vários momentos.
Para dar o ar de veracidade necessário à esta história, David Ayer não poupa o espectador de algumas cenas fortes. A fotografia é acinzentada, muito barro nas estradas e nos corpos, sangue e pedaços de corpos aqui e ali. As batalhas com os tanques dão a vibração dos filmes de ação, graças especialmente à qualidade dos efeitos sonoros e o próprio balé dos tanques inimigos. Há um apuro técnico louvável na construção dos ambientes explorados ao longo da jornada retratada.
No fim das contas, Corações de Ferro é um filme que deseja falar de pessoas em uma situação extrema. Por mais que traga cenas de guerra empolgantes e um roteiro bem construído, que derrapa um pouco apenas no final ao repetir o velho clichê do herói, é na personalidade de cada um que está dentro do tanque Fury que está o foco central. É neste ponto que brilham Brad Pitt e Shia LaBeouf, pela construção de personagens que, por mais que sejam empedernidos por fora, sentem como poucos tudo o que acontece. No caso de Pitt, é ainda mais interessante por seu personagem ser tão distante ao de outro militar recente por ele interpretado, o sádico tenente Aldo Raine de Bastardos Inglórios. Mais uma demonstração de que a idade, definitivamente, fez bem ao ator – tanto na escolha de projeto quanto na própria capacidade de atuação.