Sai da minha aba
por Lucas SalgadoCriado por Aguinaldo Silva para a novela Fina Estampa (2011), o mordomo Crodoaldo Valério chegou aos cinemas em 2013 com Crô - O Filme, que levou mais de um milhão de pessoas aos cinemas e garantiu a realização de uma continuação: Crô em Família. O bom desempenho do primeiro filme já serve como defesa da decisão de levar tal personagem para as telonas e dar ao mesmo uma segunda chance. Mas o fato de estarmos em 2018, sete anos após o encerramento da novela, justifica sim um maior questionamento: faz sentido insistir com o Crô?
E cabe repetir, estamos em 2018. Isso significa não apenas que a novela está num passado já distante, mas também o fato da sociedade ter mudado bastante no que diz respeito a recepção e representação de personagens LGBT. A verdade é que, hoje, Crô é quase que um desserviço. É um personagem super caricato, o estereótipo do estereótipo. Representa zero pessoas e, por outro lado, passa uma visão completamente exagerada.
Embora pudesse ter momentos divertidos como elemento coadjuvante em uma novela com vários personagens, parece certo que o Crô não é um personagem complexo ou desenvolvido o bastante para render duas histórias. E isso fica claro na medida em que o novo filme ignora completamente situações do primeiro, como o fato do personagem adotar uma criança ao final. Na verdade, não só ignora como, de certa forma, copia a mesma premissa.
Abalado com a perda da guarda de sua cachorrinha, Crô, determinado dia, abre as portas de sua mansão para um grupo de pessoas que dizem fazer parte de sua família biológica. Enquanto o ex-mordomo tenta ensinar modos aos visitantes, os mesmos tentam se dar bem em cima do parente rico.
Marcelo Serrado volta ao papel do protagonista, que deixa de lado as principais características das obras anteriores. Arlete Salles, Tonico Pereira, Fabiana Karla, Jefferson Schroeder e Monique Alfradique completam o time.
Crô em Família é um filme completamente fora do estilo. Não funciona com o público conservador das novelas, nem com o público moderno da internet. Neste sentido, é surreal o quanto que utiliza gírias e falas de efeito ultrapassadas, como "pedir pra parar, parou" ou "sai da minha aba". O texto de Aguinaldo Silva também representa a atualização de seu roteirista, com referência a Mulheres de Areia e falas do tipo "meu crush me mandou um match", dita por zero jovens em todos os tempos.