Com a quantidade de filmes que assisto e a quantidade de informações sobre eles que recebo é bem mais raro pra mim acontecer uma surpresa como este A Família Bélier, o que é algo altamente recompensador. O que eu sabia sobre o filme? Que era sobre uma família de surdos-mudos, com exceção da filha adolescente que, por ironia do destino, descobre ter um grande talento para o canto.
Filme sobre talentos em meio à adversidade já geraram muitos filmes, como o clássico moderno Billy Elliot. O que este filme tem de diferente é que passamos a praticamente conviver, conhecer e nos afeiçoarmos desta pequena família rural do interior da França, seguindo seu dia-a-dia, suas dificuldades e pequenos problemas, mas tudo com muita leveza e simplicidade. Não é preciso possuir alguma deficiência para nos identificarmos com esta família, que é apresentada como uma família comum, igual a todas as outras, com a vantagem de serem muito unidos e amorosos entre eles. Um elenco fabuloso e convincente ajuda bastante a criar este vínculo com o público, mesmo que em alguns momentos seja preciso o uso de legendas para entendermos a linguagem de sinais que utilizam entre eles.
Muito do conteúdo de todos os filmes sobre adolescência e amadurecimento estão lá: a descoberta do amor, a busca de um sonho, os conflitos e indecisões típicos desta fase da vida. Mas a metáfora sobre os pais "surdos-mudos" que retrata a incompreensão e a falta de comunicação que os adolescentes enfrentam acaba sendo usada de forma sutil, visto que os membros da família são apresentados como pessoas de carne e osso, com defeitos e qualidades como qualquer outro ser humano, sem uma visão condescendente e paternalista a respeito de sua deficiência. Além da história de Paula e sua difícil decisão de deixar a família em busca de um sonho, acompanhamos as tramas paralelas: a iniciação sexual do irmão mais novo, a decisão do pai em entrar para a política - este último tema rende algumas boas observações e críticas pertinentes para nossa reflexão, apesar das diferenças entre o Brasil e a França.
A Família Bélier segue uma mesma linha narrativa do recente Questão de Tempo: a leveza da comédia que domina boa parte do filme ganha uma virada dramática em seu final, quando se apresenta o tema da separação da família, revestindo o filme de uma emotividade mais latente. Para os pais que estão vivendo ou já viveram a Síndrome do Ninho Vazio - que representa a saída de casa dos filhos - o filme vai tocar mais fundo, mas esta comédia simpática e emotiva com certeza vai agradar muita gente, principalmente aos apreciadores de clássicos da canção francesa dos anos 60-70