Perdido no ano novo
por Francisco RussoNão é à toa que Domingos Oliveira leva a fama de ser o “Woody Allen brasileiro”. O estilo de seus filmes, sempre baseados na força das palavras e por vezes reservando às mulheres os papéis de maior destaque, em muitos casos guarda semelhanças com trabalhos do diretor nova-iorquino – respeitando as diferenças de qualidade entre ambos, é claro. Já há alguns anos Domingos tem trabalhado com alguma constância na sétima arte, mesmo que isto resulte em abrir mão de um certo refinamento estético. O importante é filmar, transpor as ideias do roteiro para a câmera, da melhor maneira possível. Assim também foi feito Primeiro Dia de um Ano Qualquer, inteiramente rodado na casa da atriz e produtora Maitê Proença na região serrana do Rio de Janeiro, tudo na maior camaradagem.
A história acontece justamente no tal dia 1º de janeiro de um ano qualquer, onde vários amigos estão reunidos após a passagem do réveillon. Seguindo à risca o estilo dos filmes-coral, onde não há propriamente um protagonista mas sim um grupo de personagens que se alterna com maior destaque no decorrer da narrativa, o filme é (mais) um retrato da elite intelectual que Domingos tanto gosta. O problema: por mais que haja um diálogo mais inspirado aqui e ali, a grande maioria do blá-blá-blá trocado entre eles é bobo e sem grande profundidade. Cenas como a do quase atropelamento chegam a ser infantis, tamanha a ingenuidade com a qual se desenvolvem. O único momento realmente interessante é a breve participação de Ney Matogrosso, que estrela uma divertida piada autorreferente.
Entretanto, por mais que se possa ter uma certa boa vontade devido às (poucas) condições financeiras disponíveis, o filme comete algumas falhas graves, especialmente pelo lado técnico. É câmera desfocada numa cena, cortando a cabeça de um ator na outra, edição mal feita... Chega a ser surpreendente que um diretor tarimbado como é Domingos Oliveira tenha aceito rodar um filme com tantas deficiências técnicas na fotografia e na edição.
Diante dos problemas de roteiro e de orçamento, o que resta é o clima sempre ameno que rodeia os filmes dirigidos por Domingos. Que, ainda assim, sofre abalos devido à condução elitista – no sentido pejorativo mesmo – de alguns personagens, especialmente o interpretado por Maitê. O resultado acaba sendo decepcionante, não apenas como comédia mas também dentro da própria filmografia do diretor.