De volta para casa
por Francisco RussoA primeira cena de Eles Voltam traz um plano bem aberto, mostrando a vastidão do local retratado e o quanto ele é desabitado. Em meio às montanhas, há uma estrada. Nela, um carro. O espectador sabe que algo está acontecendo nele, nem tanto pelo que vê mas pelo que ouve. Logo o carro arranca e ficam para trás dois adolescentes: Cris (Maria Luiza Tavares) e Peu (Georgio Kokkosi). Deixados na estrada pelos próprios pais, que não aguentam mais as brigas dos irmãos. No meio do nada e longe de tudo, o que fazer? Sentar e aguardar o retorno deles ou sair dali em busca de algum meio de voltar para casa? É a partir desta questão que é apresentado este filme de mistério, que tem por objetivo não causar sustos no espectador, mas fazê-lo refletir sobre a situação vivida por Cris.
Os primeiros minutos do longa-metragem apresentam uma força impressionante, pela habilidade em retratar o abandono dos irmãos e o misto de descrença inicial com desespero crescente, à medida que as horas passam. Este prólogo chega ao fim justamente com a apresentação do título, impactado ainda por uma bela canção de Milton Nascimento que serve para quebrar a apatia reinante. Só que, infelizmente, o belo cartão de visitas não se mantém ao longo de todo o longa-metragem.
A proposta maior do diretor Marcelo Lordello é fazer com que sua protagonista, Cris, se aventure em mundos até então desconhecidos, incluindo aí uma pitada da conhecida diversidade social brasileira. Criada em uma família rica e vivendo em meio ao conforto e diversos aparelhos eletrônicos de última geração, ela precisa encarar o medo e a desconfiança ao encontrar outras pessoas em sua tentativa de volta ao lar. Este contraste, explorado também em detalhes como a cor da pele e a própria roupa que ela veste, é o que há de mais interessante na jornada, também por fugir do lugar comum do preconceito. Lordello consegue trabalhar o desconhecido com habilidade, mantendo a dúvida para o espectador não apenas sobre o que acontecerá com Cris mas também em relação aos pais dela. Afinal de contas, eles vão voltar?
É justamente quando esta pergunta é respondida que o filme sofre uma queda brusca. Por mais que seja compreensível o interesse em mostrar como os eventos influenciaram Cris, a ausência de uma motivação faz com que a personagem vague meio sem rumo nos 20 minutos finais da história. Ainda assim, trata-se de um filme interessante pela narrativa desenvolvida e também pelo retrato apático de uma geração que tem tudo à mão, mas não demonstra interesse em realizar algo de fato. Neste sentido, Eles Voltam acaba sendo uma espécie de cutucão necessário. Destaque também para a bela direção de Marcelo Lordello (foto ao lado), que conseguiu criar um ritmo próprio, lento, para desenvolver a história.