Laboratório da vida real
por Francisco RussoA primeira cena de Um Homem Qualquer chama a atenção. Nela a câmera aparece do alto, como se estivesse espiando Jonas (Eriberto Leão) montar sua própria forca e cometer suicídio. Não dá certo. Em desespero, neste mesmo dia ele ainda é assaltado e tem seu carro quebrado. Tudo indicava que seria o pior dia de sua vida, mas a desconhecida Lia (Nanda Costa) o salva com um beijo – e otras cositas más que acontecem em seguida. Só que há uma questão: Lia já conhecia Jonas, pois o observava há alguns dias. O motivo? Fazer laboratório sobre como seria a vida de um homem qualquer para as aulas de teatro.
Esta dualidade de Lia é apenas uma das várias ideias lançadas no filme, algumas até interessantes, mas todas mal trabalhadas pelo roteiro. Além da questão do mistério em torno da personagem de Nanda Costa (bem nova, denunciando que o filme foi rodado há um bom tempo), há ainda a aflição sentida por Jonas, que não se sente bem diante da vida em uma cidade grande como São Paulo. Este desconforto o leva a buscar respostas na religião, o que levanta algumas questões relacionadas à fé e a crença em Jesus Cristo. A resposta aparente acaba vindo através de Isidoro (Carlos Vereza), um psiquiatra que agora vive como mendigo. Criticando a tudo e a todos, ele levanta teorias próprias que servem como manual de auto-ajuda para Jonas – que, é claro, passa a tratá-lo como mestre. Tudo isto em meio à questão do teatro, representado por Lia e também por Ígor (Pedro Neschling), seu comparsa na espionagem a Jonas. O teatro buscando a vida como fonte de inspiração é mais um dos diversos pontos largados no decorrer da trama.
Com tanto a falar, o maior problema de Um Homem Qualquer é não saber como dizer. Culpa do diretor Caio Vecchio, que conduz o filme de forma ingênua e panfletária, acreditando que os ideais proferidos pelos personagens sejam o suficiente para manter a atenção. O maior exemplo é o personagem de Norival Rizzo, que usa um discurso esquerdista antiquado como forma de ressaltar o quanto está perdido no tempo. Por mais que o auto sarcasmo seja explícito, não há a menor graça nem interesse nesta subtrama, que acaba abandonada com um desfecho óbvio. O mesmo acontece em diversas outras questões levantadas e largadas no decorrer do filme, como a presença do teatro e o personagem de Pedro Neschling.
Para quem conhece sua carreira, fica como curiosidade a personagem de Nanda Costa. Sua Lia aparenta ser uma espécie de preparação da atriz para a personagem que viria a interpretar anos depois, em Febre do Rato. Ambas possuem como base a sensualidade, mas, ao comparar as duas atuações, fica bem nítido o quanto ela evoluiu como atriz desde sua participação em Um Homem Qualquer – e também o quanto Cláudio Assis é melhor diretor, diga-se de passagem.