Vale o programa!
por Roberto CunhaA adolescência sempre foi um terreno arenoso para estudiosos e continuará sendo um momento marcante para todos os que passam por essa fase das descobertas. Em Jovem e Bela, o cineasta François Ozon nos faz observar durante as quatros estações do ano, as mudanças ocorridas na vida da protagonista aos 17 anos, quando "ninguém é sério", segundo o poeta Rimbaud. Será?
Isabelle (Marine Vacth) mantém uma relação fria com a mãe e o padrasto, ao contrário de uma cumplicidade quase insana com o irmão mais novo. Durante uma viagem de férias com a família, subverte a visão mais romântica da expressão "amor de verão" e a traduz em um simples passaporte para a perda da virgindade. No outono, mente sobre a idade e excitada pelo misterioso jogo de não saber com quem irá se encontrar, embarca na prostituição em troca de uma pretensa independência. Sozinha em suas aventuras sexuais, vivencia momentos distintos, como quem abre uma caixa de bombons e experimenta os diferentes sabores. E se o inverno traz as consequências de um trágico acontecimento, é com a chegada da primavera que ela desabrocha, descobrindo-se mais madura que seus pares, mesmo que ainda sem se dar conta do alto preço que pagou.
Para não deixar dúvidas quanto a sua, digamos, fixação voyeurista, o diretor abre sua obra com uma emblemática sequência inicial pela lentes de um binóculo (veja você), para logo em seguida vermos a bela jovem se masturbando com o travesseiro, também através dos olhos do irmão caçula. Tudo isso para iniciar você nessa jornada, que muitos poderão ver conexão com A Bela da Tarde, clássico de Luis Buñuel, mas a fêmea de Ozon ainda "engatinha" em sua vida dupla, mesmo que a passos largos, e não esboça muita emoção. Essa frieza, por sinal, pode até incomodar os mais desejosos, mas a iniciação sexual dela sintetiza bem essa estranheza que irá permear suas experiências. Aos que imaginam ser esse um tema batido, o pensamento não está errado, mas é certo afirmar que o roteiro não é raso e você pode se deliciar com suas indagações, porque o julgamento é todo seu.
Assim, a trama que conquistou o Festival de San Sebastián e concorreu a Palma de Ouro em Cannes 2013, proporciona ao espectador um sexual, às vezes tenso, mergulho nas estações da personagem. Tudo devidamente encaixado com a bonita trilha de Philippe Rombi, que "copula" perfeitamente com as (também) quatro canções de Françoise Hardy, "L’amour d'un garçon" (1963), "À quoi ça sert" (1969), "Première rencontre" (1973), "Je suis moi" (1974), que ajudam a contar um pouco desta curiosa história. Para os que conhecem o trabalho do diretor e roteirista, Jovem e Bela tem ainda um leve humor (sarcástico), além de uma pequena participação da veterana e parceira Charlotte Rampling, mas o destaque é todo de sua atriz novata. O filme pode ser menor que o recente Dentro da Casa (2012), mas é igualmente grande em sua vocação para provocar a reflexão. E até o fim. Com trocadilho, vale o programa!