Joãosinho Trinta: Origens
por Renato HermsdorffDiferente de cinebiografias extensas que tencionam traçar o retrato de uma personalidade do (quase) nascimento à (quase) morte e acabam por dispersar o espectador, Trinta toma a parte pelo todo.
A ambição do filme de Paulo Machline (Natimorto) é de outra ordem: mostrar quem é Joãosinho Trinta (a imagem que temos do carnavalesco) a partir de quem foi Joãosinho Trinta (o homem antes do mito). E esse é um dos grandes méritos do filme.
A produção acompanha o protagonista (vivido por Matheus Nachtergaele) dos anos 1960, quando se muda do Maranhão para o Rio de Janeiro a fim de se tornar bailarino do Theatro Municipal (fato que poucas pessoas conhecem, aliás); até 1974, ano em que ele assume o posto de carnavalesco da Acadêmicos do Salgueiro, tradicional escola de samba do carnaval carioca.
E daí o filme desfila passando ao largo do lugar comum. A começar pelo recorte no tempo, que exclui a apresentação da agremiação Beija-Flor de 1989, a mais famosa do carnavalesco (vencedor daquele anos com o enredo “Ratos e Urubus, Larguem a Minha Fantasia” – com a imagem do Cristo como mendigo censurada pela Igreja Católica).
Além disso, Nachtergaele não mimetiza o artista, e/mas constrói uma imagem própria bem convincente.
E, como estamos falando ainda do erudito João Clemente Jorge Trinta, você vai ouvir mais música clássica do que samba no cinema. Não há como negar a ousadia dessas escolhas de Trinta.
Há alguns artifícios de roteiro que fazem o filme perder alguns pontos. O Tião (Milhem Cortaz), por exemplo, é um personagem fictício construído claramente para ser o vilão da história. Falta sutileza. Algumas passagens são artificiais.
Mas, no conjunto, interpretações, direção, roteiro e ambientação (cenografia, figurino, maquiagem) passam em bela harmonia em Trinta. Culminando em um final apoteótico.