Quase épico, mas real.
Ao assumir o comando da saga idealizada pela escritora Suzanne Collins, o diretor Francis Lawrence não parecia capaz de criar algo que alçasse a série a um status de referência, dado seu histórico tão oscilante no cinema. Curiosamente, os três filmes que Lawrence comandou surgem como uma grandiosa absorção do poder político existente na obra de origem, pontuados de forma generosa.
Iniciado exatamente no ponto em que A Esperança: Parte 1 terminou, Katniss (Jennifer Lawrence) volta a servir como peça propagandista dos rebeldes que a utilizam para realçar a imagem do tordo salvador, alguém que está na linha de frente, capaz de enfrentara tudo e todos em busca da liberdade de Panem. Isso chega a consumir cerca de 40min iniciais do filme, pois as ações que levam o grupo de Katniss a capital são sempre registradas em vídeo, algumas vezes sutil, outras bem explícitas. Essa insistência faz com a que a protagonista perceba os primeiros indícios de que está sendo manipulada em prol de algo diferente de suas ideologias. Acompanhada por personagens já bem desenvolvidos nos filmes anteriores, a invasão da Capital sofre com baixas durante seu percurso, alguns até mesmo bobos, principalmente pela importância conquistada por certos personagens nos outros filmes da franquia.
A busca por derrubar Snow do trono de Presidente rende bons, e tensos momentos, principalmente realçados com certa competência pela montagem ágil. Duas sequências, em especial, são bem interessantes: a fuga dos bestantes, cujo desenvolvimento relembra bons momentos do ótimo Eu Sou a Lenda também dirigido por Lawrence, com um tom claustrofóbico por conta do local; e também a sequência de chegada à mansão, em que tempos um contraponto entre lealdade e desejo de poder, conceito este que molda de vez aqueles que desejam a liberdade.
Evidentemente que, apesar de ser uma grande produção precedida por outros filmes bem avaliados, em especial o antecessor direto, é nítida a queda de performance narrativa neste A Esperança: O Final. O ponto mais forte, que ganhou seu ápice no filme anterior, fica relegado aos momentos finais, a política da qual Katniss era peça chave, aqui quase inexiste, pois o foco fica tão direcionado a invasão e cenas de ação que mal somos lembrados do que realmente importa: a liberdade e a derrocada de um governo tirano.
Apesar de serem vários os problemas existentes no desenvolvimento da história, incluindo aí o pouco aproveitamento de personagens como Haymitch Abernathy (Woody Harrelson), Beetee (Jeffrey Wright), Effie Trinket (Elizabeth Banks), Presidente Snow (Donald Sutherland), Finnick Odair (Sam Claflin), Johanna Mason (Jena Malone) e Comandante Lyme (Gwendoline Christie); ainda sim o roteiro ilustra de forma pontual com as dificuldades da protagonista em ter que lidar com um fardo tão pesado, além de sermos agraciados com a pequena, mas ótima, performance do falecido Philip Seymour Hoffman, o astuto e convincente Plutarch Heavensbee.
Arquitetando sua narrativa durante três outros filmes, a saga protagonizada por Katniss Everdeen ganha, em seu último episódio, uma conclusão sóbria e contemporânea. Sóbria porque faz sentido dentro daquilo que se esperava, e contemporânea porque ilustra como a sociedade perde ante a tirania de um governo despreparado, que vislumbra unicamente interesses pessoais e de poder, ainda que isso resulte na destruição dos valores éticos, culminando na completa destruição do respeito pela sociedade.