O gato bebe leite, o rato come queijo
Passei as últimas quatro semanas tentando arrumar um jeito de assistir ao filme “O Palhaço”, escrito, produzido, dirigido e estrelado por Selton Mello. Fui a uma locadora que ainda insiste em existir perto de casa, não tinha. Tentei baixar pela internet, mas, como sou totalmente desorganizado tecnologicamente, não consegui. Daí, fui a várias banquinhas dessas de tabajaras, até conseguir um numa qualidade boa. Acho que, pela grande expectativa que estava para ver o filme que é líder em prêmios nacionais neste ano e tem grandes chances de representar o Brasil na disputa de melhor filme estrangeiro do Oscar 2013, não fiquei tão impressionado assim. Mas isso não significa que não tenha tirado uma boa lição desse longa, tão bem-produzido e dirigido e que acaba tocando as pessoas de alguma forma.
É claro que ele vai tocar mais a classe artística – ou até mesmo aqueles que se envolvem mais com a cultura. Mas a mensagem chega até você também. Isso porque o filme conta a história do palhaço Benjamim (Selton Mello) e de seu pai, Valdemar (Paulo José), que formam a divertida e entrosada dupla Pangaré e Puro-Sangue, do circo Esperança. Em meio a viagens pelo interior de Minas, Benjamim passa por uma crise existencial que, acredito eu, qualquer artista – seja ele ator, cantor, dançarino, músico, humorista, palhaço – deva passar: quem eu sou verdadeiramente? Sigo em frente porque a maré está me levando nessa jornada ou busco uma nova plateia? Eu sou artista ou eu seria mais feliz sendo um vendedor de ventiladores em uma loja de eletrodomésticos?
É aí que está o grande lance: em cenas lotadas de simbolismo e significados, dignas de aplauso pela fotografia mágica e pela trilha que completa o ambiente circense e interiorano, o pai lança a mensagem para o filho: “Na vida, a gente tem que fazer o que a gente sabe fazer. O gato bebe leite, o rato come queijo... E eu sou palhaço”. De uma maneira bem particular, eu, Luiz, por mais que tente fugir do jornalismo, por estar estressado com um dia ruim, triste por ter levado uma bronca do chefe ou cansado por ter trabalhado num fim de semana inteiro no plantão na redação, não tenho lugar para ir. Eu me encontrei entre as letras, cheguei à maturidade profissional entre os parágrafos, e poucos são os prazeres existentes que me fazem tão feliz quanto escrever e ser lido.
É assim que vários Benjamins se sentem, sejam eles de qualquer área profissional imaginável. Nem anos de análise tiram a essência que cada um tem guardada em sua caixinha do lado esquerdo do peito. O palhaço de Selton Mello questiona essa essência, assim como muitos de nós, artistas ou não, mas segue o caminho do amor para se encontrar com o humor. Tirando da trilha do filme uma joia de Nelson Ned, “tudo passa, tudo passará. Nada fica, nada ficará. Só se encontra a felicidade quando se entrega o coração”. E é assim que Selton Mello toca o seu coração e o atinge em sua determinada função. O meu foi bem de leve. Imagine se tivesse sido com força...