MERECIA UMA RECUPERAÇÃO
por Roberto CunhaA obra de Ziraldo no universo dos quadrinhos e livros dispensa maiores apresentações. Afinal, possui uma legião de leitores e o sucesso não é por acaso. Dono de um traço singular e uma narrativa diferenciada, seus personagens costumam ser dotados de humor e forte senso crítico. Esse é o terceiro livro do polêmico escritor a ganhar as telas de cinema, sendo o primeiro de 1994 (Menino Maluquinho - O Filme) e o segundo de 1999 (Menino Maluquinho 2 - A Aventura).
A trama se passa na década de 40 e conta sobre a professora Catarina (Paola Oliveira), que retorna já adulta à sua cidade no interior para lecionar na escola. Sob os olhos da sociedade conservadora, a jovem desperta sentimentos diversos, seduzindo os homens com sua modernidade, encantando os alunos com um jeito especial e provocando a fúria das professoras tradicionais, nada satisfeitas com seus métodos de ensino. Quando outro morador e "muito amigo" do passado, o Beto (Joaquim Lopes), também retorna para a cidade na função de padre, ele será pressionado para dar um jeito na vanguardice da moça e o destino de ambos começa a ser traçado.
Cheio de rostos conhecidos da televisão, como o humorista Chico Anýsio, não será difícil para o espectador se sentir meio que em casa logo nos primeiros minutos, enquanto o narrador (o menino Luizinho) conta para todos que essa história é, na verdade, de uma heroína.
Dirigido a quatro mãos, André Alves Pinto (sobrinho do autor estreando no cinema) e César Rodrigues (High School Musical - O Desafio), os profissionais que já tiveram contato com a obra do cartunista em seriados para a televisão fizeram um longa popular e com potencial para atingir os corações dos pequenos e da família.
Enquanto cinema, algumas pequenas falhas poderiam ser evitadas, como o sotaque que ora aparece, ora some. E se por um lado a trilha do estreante Ronald Valle dá conta do recado (tem até Milton Nascimento), a edição de João Paulo Carvalho (O Guerreiro Didi e a Ninja Lili e outros da desgastada franquia) vacila demais com cortes bruscos, quebrando qualquer poesia das imagens, que em certo momento chegam a flertar com os musicais do passado.
Citando de maneira indireta o clássico "Meu Pé de Laranja Lima", de José Mauro de Vasconcellos, com um rápido "meu pé de goiaba branca" no diálogo e até Alexandre Dumas, ao usar "Os Três Mosqueteiros" para transformar o que seria "uma batalha sangrenta no começo de uma grande amizade", o gosto pela leitura é incentivado das mais variadas formas e isso é um mérito do filme.
O roteiro do próprio Ziraldo é simples, o texto é de fácil entendimento e, curiosamente, seu maior pecado é não explorar melhor os pontos fortes da protagonista. Suas soluções criativas para ensinar Geografia ou a Tabuada, por exemplo, foram exploradas de maneira muito rápida e seu conflito principal (suposto amor proibido) foi pelo mesmo caminho.
De qualquer forma, vale o registro de que o conteúdo é infinitamente melhor do que os filmes dedicados à família brasileira produzidos por certos "medalhões" de valor duvidoso e sucesso nacional. Pena não terem feito o dever de casa ao esquecerem de situar melhor o não leitor do livro dentro das entrelinhas dos personagens para gerar um maior envolvimento. Ainda assim, o resultado final está longe de ser reprovado, mas merecia uma recuperação.
Assista o trailer, veja curiosidades e imagens, conheça o elenco em Uma Professora Muito Maluquinha.