Uma ode à malandragem
por Roberto CunhaUma comédia tem que ser engraçada. E o mérito aqui é exatamente o sentido literal da expressão "casa da mãe Joana" que o diretor Hugo Carvana (O Maior Amor do Mundo) e o roterista Paulo Halm (Amores Possíveis) conseguiram impor na história e ao seu ritmo. O filme tem forte influência da chanchada brasileira e Carvana parece ter certa predileção em retratar uma visão cáustica da sociedade brasileira. Basta rever sua obra como diretor nos longevos Vai Trabalhar, Vagabundo (1973), Vai Trabalhar, Vagabundo 2 - A Volta (1981), Se Segura Malandro (1978) e O Homem Nu (1997). A abertura, com leve inspiração sonora em Henry Mancini (A Pantera Cor-de-Rosa), é de bom gosto e já dá uma dica de que tiveram cuidado com a produção. Não é uma regra, mas isto denota preocupação e um exemplo fácil de lembrar são as antológicas aberturas de James Bond.
Casa da Mãe Joana mostra quatro pilantras que levam a vida numa boa por conta de pequenos golpes, mas um revés coloca a maré mansa dos caras de pernas pro ar. Surge uma dívida enorme para ser paga e aí o roteiro planta um festival de absurdos e as barbaridades vividas por eles fazem com que a história ganhe contornos surrealistas. Com uma estrutura muito similar a de um sitcom, com poucas externas e ações centradas em um apartamento, o longa prende o espectador e faz rir. Pode não ser uma obra-prima (na verdade o humor é raso), mas a missão está cumprida. E o "pegador" PR (Paulo Betti), em dado momento, parece carregar o filme nas costas, protagonizando cenas insólitas de um garoto de programa "bem passado" disposto a tudo para fazer dinheiro e livrar a turma da tal dívida.
O elenco, egresso da televisão, não compromete porque Betti (A Grande Família), José Wilker (Dona Flor e Seus Dois Maridos), Pedro Cardoso (Redentor), Antonio Pedro e Laura Cardoso (Primo Basílio) são talentosos na telinha e na telona. E a produção conta ainda com o eterno parceiro Cláudio Marzo (O Xangô de Baker Street), Agildo Ribeiro, ícone do humor brasileiro, numa participação sacana como um aposentado draq queen (fazendo uma "boquinha" desnecessária para a caracterização) e mais Arlete Salles, Roberto Maya, Beth Goulart, Malu Mader (Sexo com Amor?), Fernanda Freitas e Juliana Paes. O roteiro faz algumas citações de Psicose na trilha sonora e gestual da divertida neura da mãe de PR, e também do seriado "Jeanie é um Gênio" nos delírios do escritor Montanha (Antonio Pedro). Destaque para o som, que no cinema nacional sempre foi um problema e no filme de Carvana passa incólume. Dá para ouvir todos os barulhos que os personagens fazem e suas falas. Portanto, sem gritar muito, dá para dizer que Casa da Mãe Joana é ponto positivo para o cinema brasileiro.