A trama do filme poderá lembrar a de Náufrago e até o recente Gravidade. Mas este peculiar filme, que conta com apenas um ator (mesmo !) possui uma proposta ainda mais radical do ponto de vista de linguagem cinematográfica em sua incursão sobre a solidão e a mortalidade. Não lembro de um filme com apenas um ator, cujo personagem no caso não possui nem ao menos nome. Talvez o único que me ocorra seja o clássico O Velho e o Mar, mas não poderia dizer que o vi realmente, porque nunca consegui assisti-lo até o fim - é muito chato e absurdamente não-cinematográfico. O que não é o caso deste Até o Fim.
Em seu segundo filme na direção, J.C. Chandor - que iniciou muito bem com Margin Call - O Dia Antes do Fim - convidou o veterano ator Robert Redford quando o encontrou no Festival de Sundance - que, para quem não sabe, foi criado e é mantido pelo ator para prestigiar as produções do cinema independente mundial. Com aparições cada vez mais raras como intérprete, Redford teve que encarar protagonizar sozinho um filme, que lhe exigiu aos 76 anos peripécias físicas que não podiam contar com o auxílio de um dublê. Ele está muito bem, comprovando que ainda possui carisma suficiente para carregar sozinho um filme, entregando uma interpretação na medida certa, contida, sem exageros. Nada, porém, que justifique o entusiasmo exagerado da crítica americana, e os prêmios que se seguiram.
O que impressiona no filme não é a interpretação de seu protagonista, mas sim a própria proposta do filme. O tempo todo temos apenas o ator, a câmera e a ocasional trilha sonora para compor as cenas. Talvez este seja o único senão ao filme: a trilha composta por Alexander Ebert é tão bela que é lamentável que seja usada com tanta economia pelo diretor. Fora isto, Até o Fim é cinema puro, elevado a um estado poucas vezes visto no cinema, sem os clichês que histórias semelhantes costumam utilizar. O roteiro de Chandor evita que a personagem principal fique filosofando artificialmente em voz alta, ou que um narrador tente apresentar a história. Chandor conta a história em imagens, apenas acompanhando o seu desenrolar, de modo bastante realista. As emoções, em sua proposta, não serão entregues pelo ator, mas surgirão do espectador frente às situações vivenciadas quase que junto com este navegador solitário. Acredito que Até o Fim tem um impacto maior se você o assistir sozinho - como eu fiz.
Até o Fim é um tour-de-force técnico do ponto de vista da fotografia, com enquadramentos e posições de câmera inusitadas que lembram o clássico Faca na Água, de Roman Polanski. Não espere encontrar no filme o realismo mágico de As Aventuras de Pi. Mas se você se sentir por vezes desolado pela realidade brutal e a desesperança que irá acompanhar o desenrolar da história, será recompensado com um final paradoxalmente poético e humano, que trará a redenção da personagem sem nome interpretada por Redford.