Sexo ou religião
por Bruno CarmeloJovem Aloucada parte de uma intenção ousada: retratar de maneira direta e sem preconceitos os desejos sexuais de uma adolescente evangélica, confrontando os princípios do prazer aos princípios da moral cristã. O filme é baseado na história real de Daniela (Alicia Rodriguez), jovem que criou o blog “Joven y Alocada” para contar em segredo as suas experiências sexuais. As histórias eram bastante cruas, impregnadas da franqueza adolescente e da coragem propiciada pelo anonimato.
O filme adota uma estética pop e teen, incluindo momentos em animação, cenas com publicações do blog desfilando pela tela e muita trilha sonora adolescente. Daniela não é uma jovem particularmente politizada em seus relatos eróticos, apenas uma garota rebelde, não muito inteligente (ela deixa o computador ligado várias vezes, com indícios de suas aventuras) e temente à mãe e à igreja. Embora tenha sido filmado em 2012, o projeto parece envelhecido pela estética dos blogs antigos. Neste sentido, é impressionante como as produções que reproduzem imagens de tecnologia se tornam datadas, como reflexos diretos da época em que foram feitas.
Se Daniela não tem muita consciência do peso social de seu discurso, pelo menos a diretora Marialy Rivas adota um olhar mais consciente, certo? Não muito. O filme se diverte com algumas ousadias agradáveis, como animações de Deus despertando ereções em pênis flácidos, ou cenas de sexo que beiram o explícito, mas isso não impede que as instituições tradicionais sejam poupadas pelo filme. A igreja evangélica da mãe (Aline Küppenheim), o trabalho em um canal de televisão religioso e a escola conservadora pregam discursos contrários à livre sexualidade, embora nada na história conteste esta lógica. Daniela é censurada por todos ao redor, o que é visto como algo natural, compreensível. As duas únicas outras personagens que levam uma vida sexual livre – a irmã e a tia de Daniela – são convenientemente punidas com o exílio e com uma doença terminal.
Ou seja, por trás da aparência alegremente profana, do ritmo divertido e despojado do projeto, com suas câmeras na mão e sua iluminação negligentemente superexposta, existe um conformismo contrário à própria lógica do blog. A origem dos textos de “Joven y Alocada” era encontrar um espaço de liberdade total, onde Daniela experimentaria a homossexualidade, o sexo a três, o sexo anal e outras práticas. No filme, ela executa essas ações, mas em círculos sociais muito precisos e segregados. Por esta separação tão rígida entre vida sexual e vida familiar, os personagens coadjuvantes, sejam eles amigos (ou seja, ligados à esfera sexual) ou familiares (ou seja, ligados ao cristianismo) são todos bastante superficiais, limitados a representar a instituição em que se encontram. Talvez a ousadia maior da diretora seria sugerir possíveis encontros entre essas duas esferas, ao invés de se contentar com ilustrações de vaginas em chamas.
Por fim, é justamente o conservadorismo que entra a cena. É surpreendente quando uma reviravolta abrupta faz com que Daniela simplesmente aceite os dogmas da religião, incluindo a monogamia e outras restrições sexuais impostas pelas crenças evangélicas. O roteiro descreve este momento como uma espécie de iluminação divina, porque súbita, aleatória, e sintoma do amadurecimento da protagonista. Ou seja, profanem à vontade, caros jovens, mas quando ficarem mais velhos, vai ser preciso encaretar de novo. A conclusão de Jovem Aloucada, com belas frases vagas de cunho moral, estabelece uma triste constatação: embora o início mostre combinações lúdicas de Jesus ao lado de pênis e vaginas, a conclusão trata de afirmar que os dois são mesmo irreconciliáveis, e que o caminho divino talvez seja mais aconselhável do que os prazeres da carne.