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    T2 Trainspotting
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    T2 Trainspotting

    O futuro olha para trás

    por Bruno Carmelo

    Quando comparado com tantos filmes cult que ganham sequências e refilmagens em Hollywood, T2 Trainspotting possui algumas vantagens: primeiro, ele chega aos cinemas 21 anos depois do original, ou seja, o projeto não foi impulsionado pelo timing comercial. Segundo, a sequência é baseada num livro realmente previsto para continuar a história dos jovens drogados dos anos 1990, com uma longa passagem do tempo que se adequa às duas décadas separando as produções. Terceiro, temos a mesma equipe, o mesmo diretor, os mesmos atores e os mesmos personagens, garantindo a integridade da franquia.

    O roteiro traz o retorno de Renton (Ewan McGregor) à cidade natal, supostamente feliz e bem-sucedido, demonstrando aos colegas seu saudável vício em atividades esportivas. Este homem rejuvenescido encontra Spud (Ewen Bremner) ainda dependente de heroína, Sick Boy (Jonny Lee Miller) rancoroso quanto ao roubo no passado e Begbie (Robert Carlyle) prestes a sair da prisão. Mas como as tramas do escritor Irvine Welsh não se sustentam em otimismo, logo descobrimos que a situação de Renton é mais complicada do que parece. Os quatro voltam às drogas e ao crime, ora em cooperação, ora competindo uns com os outros.

    Como continuação, T2 Trainspotting apresenta um desenvolvimento plausível do quarteto principal. O humor corrosivo se mantém, além da estética multicolorida, barulhenta e ágil que Danny Boyle havia criado para o original. Nada disso impressiona atualmente, de modo que o segundo filme não tem a menor chance de repetir o impacto ou a relevância cultural de seu antecessor. A fragmentação excessiva da imagem enchia os olhos da juventude pré-redes sociais, mas hoje em dia, parece comportada perto de alguns vídeos do YouTube. Boyle não está preocupado em se reinventar, em trazer a gangue à linguagem cinematográfica do sécuo XXI. Ele prefere fornecer um pouco mais do mesmo, com qualidade e domínio na direção.

    O filme funciona melhor como homenagem. A trama inclui dezenas de referências, citações e trechos copiados do primeiro filme. Algumas falas são lidas tal qual no projeto anterior, outras são adaptadas aos tempos contemporâneos – caso do famoso monólogo “Escolha a vida”, em curiosa releitura, mas filmado com uma imobilidade decepcionante. Boyle não tem problema em ser comparado com o original, pelo contrário, ele convida à constante comparação. O espectador que nunca tiver visto Trainspotting – Sem Limites deve ficar perdido diante da segunda parte.

    Assim, T2 Trainspotting constitui um eficiente produto de nicho de duas horas de duração, concebido para resgatar o amor por um filme que parecia tão subversivo em 1996. A sequência, domesticada e previsível, ainda diverte do começo ao fim, embora pareça branda nas imagens de sexo e drogas. Mas o que seria necessário para causar estrondo hoje em dia? Talvez este projeto deva ser lido como sintoma do momento em que se insere: este é um filme-choque para quem não se choca com mais nada, trama-tabu para a época em que todos os fetiches e drogas estão disponíveis na Internet. É a crítica de costumes no século em que toda crítica social pode ser transformada em algo cool, autoconsciente e inofensivo.

    Filme visto no 67º Festival de Cinema de Berlim, em fevereiro de 2017.

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