Rabugento e de personalidade difícil. Essas são as características principais de Arthur (Terence Stamp), personagem principal de “Canção para Marion”, filme escrito e dirigido por Paul Andrew Williams. Durante boa parte do longa fica difícil criar uma empatia por esse personagem, por causa justamente dessas suas características, porém, na medida em que a trama de “Canção para Marion” vai avançando, a gente vai percebendo que esse é o jeito dele, que quem o ama gosta dele do jeito que ele é e, apesar disso e das coisas difíceis que ele enfrenta no decorrer da obra, Arthur não irá se entregar à Síndrome de Gabriela – explico: “eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim, vou ser sempre assim”.
É justamente esse o mote principal por trás de “Canção de Marion”. O objetivo do filme dirigido e escrito por Paul Andrew Williams é nos retratar a jornada de transformação de Arthur. Acompanhamos as mudanças pelas quais a personagem irá passar na medida em que ele vai vivenciando algumas situações bastante complicadas, como a doença terminal da esposa Marion (Vanessa Redgrave) e o relacionamento difícil com o filho James (Christopher Eccleston).
A forma como Paul Andrew Williams decide mostrar a transformação de Arthur é muito interessante. O diretor utiliza a música como forma de retratar a sua personagem derrubando, aos poucos, todas as barreiras que ele impôs em seus relacionamentos com os outros. Na medida em que deixa a música e o sentimento envolvido nessa forma de arte invadir a sua alma, Arthur começa a não ter medo de revelar tudo aquilo que sente, os seus medos e anseios e a importância que sua família tem para ele.
De muitas maneiras, “Canção para Marion” lembra outro filme inglês: “O Quarteto”, dirigido por Dustin Hoffman. Os dois filmes usam a arte – mais precisamente a música – como pano de fundo para abordar a dificuldade em relacionamentos humanos e as arestas que deixamos abertas em relação ao nosso passado, com influências diretas em nosso tempo presente. Além disso, os dois longas possuem finos atores ingleses em seu elenco. Se “O Quarteto” tinha Maggie Smith, Tom Courtenay, Billy Connolly e Pauline Collins na sua linha de frente; “Canção para Marion” tem Vanessa Redgrave e Terence Stamp arrasando com nossas emoções em duas lindas atuações.