Terra Firme: Crítica AdoroCinema

Em uma pequena ilha italiana, os habitantes locais sobrevivem aproveitando ao máximo o curto período do verão. É nesta época que os turistas chegam aos montes, enchendo pousadas e casas, passeando de barco ou simplesmente gastando seus aguardados euros. Entretanto, por trás deste ambiente claramente capitalista – e tão comum em tantas outras áreas turísticas ao redor do planeta – há uma realidade batendo à porta e pedindo para entrar: são os imigrantes africanos, clandestinos, que superlotam barcos na esperança de uma vida melhor no continente europeu. O problema: a polícia local não só os deporta tão logo consiga capturá-los, como ainda por cima recrimina e prejudica todo barco italiano que os ajuda em alto mar.

O conflito existente entre o combate à imigração e as mais básicas condições dadas a qualquer ser humano é o que realmente interessa o diretor Emanuele Crialese em Terra Firme. Para tanto ele desenvolve um universo onde há representantes de cada um dos lados envolvidos: o capitalista que quer ganhar o máximo de dinheiro possível (o tio), o que defende a lei dos mares e prega que nenhum náufrago ficará sem ajuda (o avô) e os que punem quem ajuda (a polícia). Entre eles há o jovem Filippo (Filippo Pucillo), cuja personalidade ainda está em formação e é a mola mestra de todo o filme. É ele quem ajuda o avô a resgatar diversos náufragos, entre eles uma mulher grávida. É ele quem a leva para a casa da mãe, onde recebe abrigo. É ele quem lida com os turistas e com o tio, por vezes tentado pela facilidade em ter as coisas. É ele quem recebe um choque de realidade, ao se ver tomando uma atitude que jamais imaginaria ter.

Por mais que Terra Firme tenha personagens interessantes e bem atuados, o que realmente interessa no filme é seu pano de fundo. Crialese cria um típico cenário capitalista e pergunta ao espectador se é aquilo que ele deseja para sua vida, levantando a possibilidade de um sistema econômico mais humano, que não descarte de imediato aquele que não tem as mesmas condições financeiras. O filme faz uma analogia à pobreza que ronda as grandes cidades, muitas vezes invisível para boa parte de seus habitantes, mas que permanece lá, viva. É o som ao redor que nem sempre é percebido.

Principalmente pelo debate levantado, Terra Firme é um filme que merece ser conferido. Entretanto, o longa-metragem ainda brilha especialmente na fotografia, com o belo uso das sombras para criar uma cena bastante tensa quando Filippo e uma turista estão sozinhos em um barco em alto mar. Além disto, como demonstra a tragédia de Lampedusa, ocorrida três anos após o filme ter sido rodado, trata-se de um assunto bastante atual.