Pimenta nos olhos dos outros
por Bruno CarmeloVendo o péssimo cartaz brasileiro, pode surgir a impressão de que Meu Primeiro Casamento é a adaptação cinematográfica de algum programa humorístico apelativo da Rede Globo. O trailer também favoriza as (raras) piadas de humor físico, sugerindo que esta seja uma enésima comédia de "objetos que voam em direção a testículos" e finezas do gênero. Felizmente, o resultado supera estas primeiras impressões.
Não que o tema do matrimônio seja poupado, longe disso. O casamento, que é provavelmente o evento social e familiar com mais regras, conveniências e códigos de conduta, sempre foi e sempre será um prato cheio para o humor. Esta produção não hesita a gerar a comicidade clássica que consiste a estragar aquilo que havia sido feito com muito cuidado: suja-se o vestido, perde-se a aliança, estraga-se o bolo... Dá-se ao público o bom e velho prazer de rir da desgraça alheia.
O fato é que, mesmo se o filme não traz nada realmente novo ao gênero, ele também se sai melhor do que a média. Sai de cena a idealização dos personagens, e também o amor romântico quase obrigatório (a relação entre os noivos parece um tanto saudável, realista). Com uma dose de ironia muito bem-vinda, os dois ótimos atores principais (Natalia Oreiro e Daniel Hendler) transformam essa trama rocambolesca e pouco verossímil em uma diversão de boa qualidade.
Acrescentam-se aos méritos do filme uma curiosa viagem de um padre e um rabino que, embora lembre algum início de piada chula, desperta um humor simples, cordial, mas também inteligente sobre o embate de culturas. Este aspecto inofensivo é o que chama a atenção em Meu Primeiro Casamento: não há piadas grosseiras, escatologia, humor negro, erotismo... A produção acaba por restituir uma tradição da comédia familiar, a ser apreciada por pais e filhos, divertida e despretensiosa, tão preocupada com o ritmo do roteiro quanto negligente com a estética.
É talvez neste aspecto que a obra deixe a desejar: seja na música onipresente que apenas sublinha as emoções do momento (cordas tristes para momentos sentimentais, percussão fanfarrona para a comédia), seja na montagem que não vai além das histórias paralelas, todo o aspecto técnico e criativo parece se esconder atrás do roteiro. Mesmo assim, o filme consegue restituir uma certa dignidade a um subgênero (o "filme de casamento") longamente maltratado pelo cinema comercial. E isso não é pouco.