Baseado em fatos reais e abordando um tema interessante e polêmico, Capitão Phillips presentei o espectador com uma bela atuação de Tom Hanks e uma realidade dura e cruel. Pensado para concorrer ao Oscar nas categorias principais, o novo filme do diretor Paul Greengrass acaba algumas vezes sendo e técnico demais, porém cumpre um papel fundamental de fazer o espectador conhecer um pouco da pirataria no mundo atual e buscar formar uma opinião sobre o assunto.
A pirataria mostrada no filme tem como foco a Somália com toda sua miséria e atrasos que nos fazem questionar se é possível existir um lugar tão fora dos padrões em pleno século XXI. Alguns poucos dominam este mercado de saquear e sequestrar embarcações comerciais que precisam se aproximar da costa africana, obrigando, na maioria das vezes, que membros de tribos façam parte de tripulações de piratas. Só assim existe uma oportunidade de sair de toda aquela miséria. O instinto básico de sobrevivência fica claro na escolha desta tripulação, onde a especialidade de cada um não foi aprendida na escola ou desenvolvida para ganhar dinheiro, e sim para continuar a respirar, viver. Parece uma escolha de time em um futebol de rua. Ninguém faz nada de forma perfeita, mas uma pequena diferenciação já é suficiente para fazer parte da equipe. A pirataria é mostrada de forma bem detalhada, sem o romantismo ou o a beleza do anti-herói pirata que já foram retratados na história do cinema. É possível ver o sofrimento dos piratas somalis em seus rostos. Aquilo tudo não é um caminho errado escolhido. É o único caminho que lhes foi dado, sem escolhas.
Capitão Phillips nos traz um tema diferente, apresentando um desenvolvimento de enredo bastante simples. E mesmo com esta simplicidade, ele ainda é capaz de incitar dúvidas sobre qual caminho o longa irá seguir. Talvez um caso de Síndrome de Estolcomo, surgindo uma amizade entre a tripulação e o capitão com os piratas? Ou alguma reviravolta mirabolante por parte da tripulação que consegue deter a ação dos piratas? De qualquer forma, a atenção de quem assiste é prendida e este fica inquieto para saber o que acontecerá no final, que acontece da forma mais real possível. A intensidade do filme, aliás, aumenta com o passar do tempo, mostrando um início bastante morno e monótono, crescendo em interesse no meio e chegando ao seu grande ápice no seu final tenso, algo bastante parecido com o vencedor do Oscar de 2013, Argo. A temática nacionalista também é outro ponto em comum entre os dois filmes, o que nos leva a pensar em altas chances de Capitão Phillips também concorrer ao Oscar de melhor filme, tendo em vista a previsibilidade e adoração da academia para este tipo de produção.
Uma coisa que pode ser previsível, porém com todos os méritos, é a possível indicação para o Oscar de melhor ator para Tom Hanks e quem sabe de melhor ator coadjuvante para Barkhad Abdi. É fato que Capitão Phillips se apoia nas atuações, principalmente dos seus protagonistas capitães. Os papeis de capitão herói precipitado e de pirata somali com vida sofrida caiu muito bem para ambos os atores –
impressiona ver Tom Hanks em estado de choque após ser resgatado pela marinha americana, assim como também impressiona ver a expressão de sofrimento passada por Barkhad Abdi durante todo o filme
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A parte técnica do filme também é muito bem trabalhada. Capitão Phillips é uma película bastante técnica, reproduzindo detalhes mínimos com maestria. Isto acaba, algumas vezes durante o filme, sendo um pouco monótono. Porém é impossível negar que se realizou um trabalho primoroso com os detalhes. Todos os procedimentos do navio, como carregamento de mercadorias e ações contra piratas, são mostrados de forma bem convincente. A câmera seguindo tanto o capitão Richard Phillips quanto Muse no início do filme nos passa bem o que cada um sente com relação à situação na qual estão para entrar. E a ação da marinha é mostrada de forma espetacular e empolgante, sendo um dos pontos mais empolgantes do filme.
É certo que Capitão Phillips levanta alguns pontos controversos e isso faz com que o espectador reflita um pouco sobre cada um destes pontos, passando a entender um pouco mais sobre eles. A pirataria pode parecer algo inadmissível e cruel à primeira vista, mas ao se defrontar com a realidade da Somália, por exemplo, não é tão absurdo passar a pensar que as circunstâncias e os atos podem acarretar consequências diversas. Desta forma, nem todo bandido possui necessariamente um caráter ruim ou fizeram uma escolha errada. Ao presenciar o que acontece em Capitão Phillips, começamos a entender que muitas vezes não existe uma escolha a ser feita. A soberba e prepotência dos americanos – tanto do capitão Richard Phillips quanto da marinha – ao tratar com um povo que eles, mesmo que inconscientemente, consideram inferiores fica bem clara em diversas partes do filme. E não passam impune por Muse que, sempre se mostrando bastante sereno em seus comentários, critica e rebate muito bem todos os comentários provenientes dos americanos e de toda aquela situação onde está inserido. É triste ver a tripulação do navio sequestrado tentando comprar sua liberdade oferecendo comida. E é mais triste ainda ver o capitão Richard Phillips colocando em questão, de forma ingênua, mas que soa bastante hipócrita, que estão levando alimentos para a África – sendo que as quantidades destes são ínfimas comparadas com as mercadorias transportadas que darão lucro. O que não é triste é presenciar a sagacidade na resposta de Muse, que, por exemplo, destaca muito bem toda a exploração dos países tidos como de primeiro mundo ao continente africano.
No fim Capitão Phillips é um filme que nos faz refletir um pouco. No mostra que por mais que pareça absurdo, às vezes é possível olhar com outros olhos atos bárbaros e questionar se realmente existe um lado certo ou errado em determinada história. Não é um filme excepcional, ao contrário das atuações de seus protagonistas. Não acho que mereça ser indicado a algum Oscar de conjunto da obra, como de melhor filme, embora possua uma temática adorada pela academia bastante semelhante com a do vencedor do Oscar do ano passado, Argo. A diferença é que os concorrentes do segundo eram muito mais fracos do que os concorrentes do primeiro este ano. Resta esperar se esta injustiça será cometida na maior premiação do cinema mundial. De qualquer forma é um filme que vale ser assistido, apesar de que fui para o cinema esperando muito e sai com o sentimento que poderia ter sido mais.