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    Planeta Solitário
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Planeta Solitário

    Angústia a céu aberto

    por Bruno Carmelo

    Este filme começa com uma cena escura. Ouve-se o gemido insistente de uma mulher, além de um ruído mecânico. Seria uma cena de sexo? De agressão? Ela estaria em perigo? Logo a imagem se revela e descobrimos Nica (Hani Furstenberg), pulando nua sobre uma cama, com frio após tomar um banho gelado. Ela está esperando o namorado Alex (Gael García Bernal) trazer a toalha. Este momento inicial representa bem toda a aventura de Planeta Solitário, que manipula com destreza as expectativas do espectador, sugerindo diversos acontecimentos (alguns banais, outros horríveis) ao longo de uma viagem minimalista.

    A talentosa diretora Julia Loktev jamais facilita a compreensão do público. Não existem informações sobre o passado dos personagens, nada de reviravoltas fáceis para acelerar ou concluir a trama. Os perigos sugeridos são típicos de viagem comum: e se esse casal de mochileiros se perder? E se o desconhecido guia Dato (Bidzina Gudjabidze) tentar enganá-los? O que vai acontecer se acabar a água, a comida? Loktev, em bom ritmo, insere todas essas possibilidades no horizonte do filme, fazendo a alegria inicial ceder espaço a uma trajetória asfixiante. Os espectadores mais pacientes podem imaginar uma eventual armadilha, já os mais fantasiosos não tardarão a perceber sugestões de estupro e assassinato no caminho de Nica e Alex.

    Planeta Solitário une-se a outras obras interessantes, como Mar Aberto, Meek’s Cutoff e A Faca na Água, em que a viagem de um pequeno grupo de personagens acaba se transformando em pesadelo pelos próprios perigos da natureza e da convivência forçada. O realismo surge como a estética perfeita do terror (nada mais assustador do que ver o tempo de passando, o perigo se aproximando...), por isso a diretora trata as cenas de maneira calma, com diálogos naturais, dando tempo aos atores para demonstrarem sua dinâmica de casal, suas brincadeiras, sua personalidade. É nesses tempos “mortos” que se desenvolve uma tensão crescente, fundamental para a adesão do público.

    Pode-se compreender que alguns espectadores e críticos não embarquem no ritmo monótono desta história, no entanto, para aqueles que se deixarem levar pelas insinuações do roteiro, esta é uma bela e perturbadora viagem. Mesmo o tão aguardado clímax é propositadamente anticlimático, resolvendo-se com uma rapidez que beira o cômico. Loktev nega-se a transformar o seu filme em um suspense qualquer. Ela opta por manter, durante as quase duas horas de narrativa, a dúvida sobre o que realmente está acontecendo, e sobre o peso das ações que estamos vendo em tela. São raríssimos os filmes que preferem esconder ao invés de mostrar, sugerir ao invés de explicar. Por isso, Planeta Solitário é tão estimulante e especial. 

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