Animação, gênero para crianças??? Não mesmo, há muito tempo isso deixou de ser verdade. Apesar de ser prioritariamente um filme para crianças, a nova animação do Carlos Saldanha (brasileiro responsável pelos sucessos que foram as franquias “A era do gelo” e “Rio”), “O touro Ferdinando”, contém várias e várias criticas sociais implícitas, das quais somente os adultos entenderão de forma plena. Apesar de ser uma adaptação de um livro de 1936, o contexto da animação é muito atual.
Ambientado na Espanha atual, a história começa com um bezerro chamado Ferdinando, que desde jovem cresce em uma fazenda de criação de touros para as tenebrosas touradas. Porém desde jovem Ferdinando já mostra que não é como os outros bezerros, não tem o ímpeto para a briga e que é característico de seus companheiros. Quando seu pai é escolhido para a uma tourada e não retorna mais, Ferdinando resolve fugir. Acaba em uma fazenda de cultivo de flores, onde é acolhido por uma garotinha e seu pai. Vivendo em um paraíso recheado de muito amor, Ferdinando cresce e vira um enorme touro, mas ainda com aquele coração mole. Porém o cruel destino faz com que Ferdinando retorna à fazenda de onde fugiu. Reencontrando os antigos companheiros e conhecendo novos e excêntricos animais (em especial a cabra Lupe), o bondoso Ferdinando novamente é candidato a participar de uma infame tourada. Começa então uma verdadeira batalha interna em Ferdinando, que mantém sua postura pacifista, tentando convencer seus novos e velhos companheiros de que ser o “escolhido” não é o verdadeiro caminho para a glória. A mudança de rumo de todos começa quando Ferdinando descobre a terrível verdade que se esconde por trás do glamour de participar de uma tourada, e a revela para seus companheiros.
Cheios de momentos engraçados e personagens bastante peculiares, a animação mantém desde o início a bandeira da paz, da não violência, da opção pela gentileza. Ainda que seja ambientada em uma Espanha moderna, percebe-se claramente que o filme é extremamente crítico em relação ao cruel (e milenar) costume ibérico de se matar touros em uma arena. Mesmo se pensarmos que em 1936 o livro tenha causado um verdadeiro alvoroço na época (por conter ideias revolucionarias e que eram contrárias ao costume popular de se sacrificar animais nas arenas espanholas), o impacto em uma Espanha de hoje é menor. Mas as touradas continuam sendo umas das tradições mais abomináveis e persistentes, mesmo em um país que se considera moderno (?????).
Com esse pano de fundo bastante terrível, “O touro Ferdinando” é uma animação belíssima, indicada para crianças e adultos. A principal lição que o filme deixa é de que o melhor caminho a se seguir na vida é o caminho do pacifismo, mesmo em um mundo cheios de Trumps e Kim Jong-unS, que ainda acreditam no uso da força para resolver os problemas.
Se um touro enorme como Ferdinando (uma verdadeira fera) mostrou que podia sim ser uma criatura pura de coração, um ser de bondade, porque nós não pudemos ser assim também??? Podemos sim ser como ele, bondosos, amorosos, e gentis acima de tudo. Nosso mundo doente precisa de pessoas que sejam verdadeiros avatares do touro Ferdinando. E eu, particularmente, já conheço alguns desses avatares e me esforço pra se igualar a um deles algum dia.
Gentileza, acima de tudo.