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    Rainha do Deserto
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Rainha do Deserto

    A namoradinha do Oriente

    por Bruno Carmelo

    Existem várias maneiras de contar a história de Gertrude Bell. Procurando rapidamente no Google, descobre-se que esta mulher foi uma escritora, exploradora, arqueóloga, grande conhecedora dos nômades do deserto, perita em várias línguas, exímia articuladora política entre povos árabes, e peça fundamental na delimitação de países como o Iraque e a Jordânia.

    Para Werner Herzog, no entanto, ela foi acima de tudo uma mulher apaixonada. Em Queen of the Desert, Gertrude (Nicole Kidman) é vista simultaneamente como filha mimada de pais ricos, mulher apaixonada por um secretário (James Franco), seduzida pelo famoso T.E. Lawrence (Robert Pattinson), destruidora de lares através de sua relação com um oficial casado (Damian Lewis), conquistadora dos sheiks mais violentos e apaziguadora dos beduínos mais sanguinários.

    O filme enxerga Gertrude por sua relação com os homens, ou seja, como esposa, filha, amante etc. Os feitos científicos e históricos descritos acima aparecem de passagem, embutidos em letreiros apressados no fim do filme. A direção abraça a premissa de um romance em estilo literário, com diversos personagens e amores que se fazem e desfazem ao longo de muitos anos.

    Herzog coroa esta novela com uma linguagem emprestada ao épico, mas de maneira mal ajustada: a trilha sonora é insistente demais, os planos em gruas são tão longos e grandiloquentes que beiram o absurdo, os movimentos de câmera são bruscos demais. Em combinação com os diálogos atrozes, o resultado é uma obra involuntariamente engraçada, por não perceber que as proporções desejadas não cabem na dimensão do projeto. Queen of the Desert parece uma pessoa franzina vestida em roupas gigantescas.

    As atuações não são muito boas, mas é preciso desculpar os atores: é realmente difícil proferir aquelas frases de modo convincente. Pattinson ao menos se diverte com um tipo canastrão e mulherengo, Franco tenta ser doce e ingênuo (embora seja uma escolha curiosa para o papel), e mesmo Nicole Kidman cria um arco crescente para a sua personagem, apresentando momentos mais fortes na segunda metade da história. Mas cenas como o medo do abutre no topo da torre, o primeiro beijo na planície aberta ou o amante sedutor subindo pela sacada beiram a paródia.

    Mesmo assim, fica a incômoda sensação que os desertos do Oriente Médio durante a Primeira Guerra Mundial representavam uma viagem ideal para uma mulher sozinha. Afinal, em cada ataque de beduínos no deserto, Gertrude se livra com seu charme feminino, seduzindo sheiks e oferecendo presentes. Com jeitinho, uma mulher conquista tudo, diria o pensamento machista que vê no poder de sedução o maior atributo feminino. Uma cena representa bem esse ponto de vista: quando uma ajudante diz a Gertrude que ela é a "Rainha do Deserto", a personagem corrige: "Não. Sou apenas uma mulher que sente falta do seu homem".

    O mais curioso deste projeto é o diretor que o assina. Herzog é responsável por alguns dos melhores documentários da história do cinema, investigando de maneira extremamente complexa a psicologia humana (em O Homem Urso, por exemplo) ou a história e a filosofia (Caverna dos Sonhos Esquecidos). Mas nesta ficção, ele trabalha com personagens superficiais, ações esquemáticas e amores impossíveis.

    Filme visto no 65º Festival de Berlim, em fevereiro de 2015.

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