Um filme profundo
por Bruno CarmeloEste drama segue uma tradição narrativa clássica que associa a profundidade dos sentimentos ao sofrimento infligido aos protagonistas. De acordo com este raciocínio, comédias seriam necessariamente leves, mas histórias de doenças, luto e desilusão amorosa gerariam uma catarse no espectador. O Último Concerto escolhe como ponto inicial um mecanismo em bom funcionamento - um quarteto de cordas renomado, estável, cujos membros são amigos e parceiros há 25 anos - e planta uma bomba em sua estrutura: um dos músicos (Christopher Walken) é diagnosticado com Mal de Parkinson. Segue uma espiral veloz de brigas, lágrimas, traições e batalhas de egos.
O roteiro poderia se desenvolver como um bom melodrama, mas o texto nega aos personagens uma psicologia complexa. Cada um é definido por uma ou duas características: na primeira cena, Peter (Walken) tem dificuldades em tocar o violoncelo. Na cena seguinte, a médica o diagnostica com a doença, na terceira cena, ele anuncia o problema aos companheiros, e em todas as suas aparições, ele será reduzido ao problema de saúde (tomando remédios, procurando substitutos para o quarteto etc.). Peter é “o homem com Parkinson”, sem cenas de respiro, de paixões ou sonhos. Da mesma maneira, Daniel (Mark Ivanir) é o líder autoritário do quarteto (todas as cenas insistem em sua rigidez), Robert (Philip Seymour Hoffman) ocupa a função de segundo violino, amargurado por nunca se tornar líder (e dá-lhe cenas de complexo de inferioridade), Juliette (Catherine Keener) é a sedutora, cativando os três homens enquanto se mantém distante emocionalmente de todos (mais momentos de sedução).
O elenco escolhido é de fato excelente, mas é uma pena que atores do calibre de Hoffman e Walken não tenham um texto mais denso para trabalhar. Keener é capaz de demonstrar vasta gama de emoções, mas o roteiro só lhe fornece cenas em que aparece com os olhos marejados e tristonhos, assim como Hoffman não tem a oportunidade de desenvolver a origem de suas inseguranças como marido e músico. Todos estes personagens são urgentes, instantâneos, vivem apenas no presente, reagindo de maneira exterior (lágrimas, socos, gritos) ao que careceria de construção interior. Seria curioso descobrir o que atraiu um elenco tão talentoso a este projeto modesto.
Mas de todos os problemas presentes, certamente a direção de Yaron Zilberman se sobressai às demais. Em sua primeira experiência com ficções, o diretor apresenta uma construção visual e rítmica paupérrima, apostando em infinitos planos e contraplanos durante as brigas, fechando o enquadramento no rosto de seus personagens e achatando o fundo do quadro. As cenas noturnas são desajeitadas, incluindo uma discussão mal filmada dentro de um táxi e uma caminhada pelas ruas que parece algum erro de câmera, do tipo que teria sido cortado na mesa de edição. Em uma trama sobre música, sobre arte, com tantas idas e vindas dos personagens, o espaço e o tempo mereceriam tratamento mais sofisticado, sem falar na densidade que a cidade poderia conferir aos transtornos emocionais dos músicos.
Pelo menos, a conclusão é simbolicamente eficiente. Talvez o tom solene e profundo da narrativa conquiste os cinéfilos de maior idade, que também podem ser atraídos pela constante música clássica na trilha sonora - para compensar o fato de que os personagens raramente tocam seus instrumentos em tela. Estão em cena todos os tapas e beijos que se espera de uma grande tormenta de paixões, e neste sentido O Último Concerto cumpre a sua função de catarse. Mas na falta de psicologias desenvolvidas e uma mise en scène afiada, o filme funciona melhor como exercício de apelo emocional do que como retrato de quatro músicos em crise.