Sem foco e sem brilho
por Lucas SalgadoM. Night Shyamalan talvez seja um dos cineastas mais regulares de Hollywood nos últimos anos. Isso, no entanto, não é uma grande qualidade, afinal é regularmente ruim. Fez grandes trabalhos em O Sexto Sentido e Corpo Fechado, e até conseguiu criar um suspense bacana em Sinais e A Vila, quando jogou tudo fora em busca de um "final surpreendente". Depois disso, só piorou com A Dama na Água, Fim dos Tempos e O Último Mestre do Ar. Depois da Terra não é um dos seus piores trabalhos, mas tampouco ficará marcado como um grande filme.
Estrelado por Will Smith e seu filho, Jaden Smith, o longa possui um sério problema de falta de foco. Começa querendo passar uma mensagem ambiental, flerta com o drama familiar, investe na aventura fantasiosa e na corrida contra o tempo. Não se sai bem com nenhum dos elementos.
Na trama, os seres humanos são obrigados a abandonar o planeta Terra após consumirem todos seus recursos. Conseguem se estabelecer em outro planeta, mas sofrem com os constantes ataques de criaturas alienígenas chamadas de Ursa, que caçam suas vítimas por sentirem o cheiro do medo nela (é sério!). É quando os humanos desenvolvem uma técnica chamada de fantasma, em que se privam do medo para enfrentar os bichos (sério mesmo!).
Em meio a tudo isso surge Kitai (Jaden), um cadete que sonha seguir os passos do pai Cypher (Will Smith) como ranger, soldado especializado em enfrentar as tais Ursas. Kitai não tem uma boa relação com o pai, que é autoritário e está sempre afastado, mas por intervenção da mãe (Sophie Okonedo) vai parar numa missão especial ao lado dele. As coisas, no entanto, não dão muito certo e a dupla se vê isolada na Terra, com Kitai tendo que superar sua insegurança para lutar contra os desafios impostos pelo local.
Um dos maiores astros de Hollywood da atualidade, Will Smith parece bem desconfortável no papel. Ele, que já provou ser um ótimo ator em filmes como Ali, tem como única função dar deixas para o filho, que também não está bem. Jaden ainda não se mostra capaz de assumir um papel tão físico como este. Se quiser ver um bom trabalho entre pai e filho talvez a melhor opção fosse assistir novamente À Procura da Felicidade.
After Earth (no original) é um filme que ficará por pouco tempo na cabeça do espectador, o que por um lado já é algo positivo com relação aos últimos trabalhos de Shyamalan, afinal não possui nenhuma cena tão ruim que ficará marcada em nossa mente como a de Mark Wahlberg conversando com uma planta em Fim dos Tempos. Mas voltando ao novo longa, é inegável que estamos diante de algo pouco marcante.
Para uma produção orçada em mais de US$ 100 milhões, Depois da Terra também decepciona com relação aos efeitos visuais. As naves, as bases, os planetas, as viagens no espaço... nada é novo. Tudo já foi visto. A Terra vista aqui, por sinal, lembra bastante a Pandora de Avatar. Talvez seja menos colorida, mas o conceito de hostilidade da natureza é o mesmo. Um dos maiores fracassos da história do cinema, John Carter: Entre Dois Mundos, por exemplo, se sai bem melhor tanto no quesito aventura espacial, quanto na qualidade dos efeitos especiais.
Com sequências de ação ensaiadas e sem emoção, com o protagonista dando pulos e adotando técnicas de combate apenas pelo estilo, o longa lembra em alguns momentos jogos de aventura de vídeo games, como fica claro na cena em que Kitai é perseguido por um grupo de macacos ou em noções como "pontos quentes", onde o jogador aproveita para recuperar as energias. Como num game, os protagonistas não se alimentam, mas utilizam-se de substâncias especiais que ajudam em sua sobrevivência. Há também a noção superficial de honra que só incomoda o espectador, afinal a questão de patentes é lembrada em pouquíssimos momentos durante a trama.
Shyamalan, que escreveu o roteiro em companhia de Stephen Gaghan, falha na construção de um clima de suspense e terror, um de seus pontos positivos mesmo em suas obras falhas. Também oferece momentos totalmente desnecessários, como quando o personagem de Jaden "vê pessoas mortas", no que só pode ser uma referência ao seu melhor filme, pois não há outra necessidade em termos narrativos.